Universidade Federal de Minas Gerais

Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas

Departamento de Sociologia e Antropologia

 

 

 

 

 

 

 

 

 

“O Conflito por Água em Belo Horizonte:

O Caso da Mina de Capão Xavier”

 

 

Isabela Gomes Welter

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Belo Horizonte, 2008

 

Isabela Gomes Welter

 

 

 

 

 

 

 

 

 

“O Conflito por Água em Belo Horizonte:

O Caso da Mina de Capão Xavier”

 

 

Monografia apresentada ao Curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Ciências Sociais.

 

Orientadora: Profª. Drª. Andréa Luisa M. Zhouri

 

 

 

 

 

Banca examinadora:

Profª. Drª. Andréa Luisa M. Zhouri (Orientadora / UFMG)

Profª. Drª. Ana Lúcia Modesto (UFMG)

 

 

 

 

 

FAFICH / UFMG

Belo Horizonte

2008

 

AGRADECIMENTOS

 

 

 

Aos meus pais Maristela e Marco Túlio pelo ambiente confortável e carinhoso que me proporcionam em casa.

 

A Mariana e Cristiano pelas conversas e por levarem de maneira bem humorada os meus momentos mal humorados.

 

Ao Romain por manter batendo forte o meu coração, pelo incentivo e presença calorosa na minha vida, mesmo com a distância de um oceano inteiro nos separando.

 

A Geni pela atenção e por ter me emprestado o Lap Top num momento crucial da escrita.

 

Aos meus amigos queridos de FAFICH, pelas boas conversas de cantina, corredores e jardins, onde sempre encontro um rosto conhecido com tempo disponível para jogar algumas palavrinhas fora.

 

A minha amiga do coração: Jana, pelo apoio, animação e disponibilidade constante.

 

Aos amigos queridos: Rafa, Cris, Laura, Celso, Carina, Dani e Gui, pelos muitos momentos divertidos que passamos juntos nas ‘altas’ conversas nos bares da vida e, por terem preenchido com uma quantidade incontável de e-mails os meus momentos de falta de inspiração.

 

Aos amigos Ana e Fabiano, amigos recentes, mas não menos importantes, por terem sido bons ouvintes nesses últimos meses e ótimos parceiros de trabalhos de faculdade.

 

Aos demais amigos da vida, que sempre (re)aparecem no momento certo quando eu começo a pensar que já estou sentindo saudades deles.

 

Aos queridos e sempre atenciosos companheiros do Gesta, pelas trocas de experiências e conhecimentos.

 

Ao Frei Gilvander por ter me emprestado o material importantíssimo para a elaboração dessa monografia e a atenção dispensada nas trocas de e-mail.

 

A professora Ana Lúcia Modesto pela pronta disponibilidade e atenção.

 

E finalmente, a professora Andréa Zhouri pela sua enorme energia e trabalho que inspira seus alunos e principalmente, pela disposição e paciência em analisar as linhas tortas dessa monografia, ajudando a colocá-las num eixo mais alinhado.

 

 

 

A todos, meus sinceros agradecimentos.

 

 

 

 

 

 

 

 

RESUMO

 

 

 

A presente monografia apresentará uma análise do caso da exploração de minério na Mina de Capão Xavier, área próxima ao município de Belo Horizonte, sendo essa exploração situada exatamente num local onde se concentram alguns dos mananciais de água que abastecem parte da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Neste contexto, destaca-se a assimetria de racionalidades de apropriação de um mesmo território contrastando a lógica hegemônica da “Modernização Ecológica” (BLOWERS: 1997), como a observada pela empresa MBR, que impõe a apropriação dos recursos naturais de maneira mercantilista e economicista, com a lógica da “Justiça Ambiental” (ACSELRAD, 2004), apropriada pelo Movimento Capão Xavier Vivo, que pressupõe a existência de outras “racionalidades sustentáveis” com o entorno, para além da apropriação produtiva da natureza. Esses conceitos irão colaborar com o entendimento dos sentidos de uso e significados projetados num mesmo território em disputa, onde de um lado se tem a MBR, mineradora interessada em extrair o minério de ferro que consiste num insumo importante para o mercado e suas dinâmicas de exportação, e do outro, o Movimento Capão Xavier Vivo composto por membros da sociedade civil de segmentos diversos, reunidos em prol de uma mesma causa, qual seja, da proteção às águas de abastecimento público dos mananciais existentes na área da mineração em questão. As mobilizações desse movimento social em defesa do direito a água colocam em pauta a importância dos movimentos sociais como espaços de resistência frente às concepções hegemônicas de mundo, assim como os distingue como peças chaves da participação política reivindicando por direitos humanos, questões ambientais, de gênero, etnia, entre outros.

 

Palavras Chave: Modernização Ecológica; Justiça Ambiental; Movimentos Sociais; MBR; Movimento Capão Xavier Vivo.

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

E lá vai deus sem sequer saber de nós
saibamos pois
estamos sós

 

Marcelo Camelo

LISTA DE SIGLAS

 

AMDA – Associação Mineira de Defesa do Ambiente

APEE – Áreas de Proteção Especial Estadual

BID – Banco Nacional de Desenvolvimento

CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente

COPAM – Conselho de Política Ambiental

COPASA – Companhia de Saneamento de Minas Gerais

CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito

CPT – Comissão Pastoral da Terra

CUT – Central Única dos Trabalhadores

DHESC – Plataforma de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais

EIA – Estudos de Impacto Ambiental

FAFICH – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas

FEAM – Fundação Estadual do Meio Ambiente

GESTA – Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais

IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis

IEF – Instituto Estadual de Florestas

IPHAN – Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico

LI – Licença de Instalação

LO – Licença de Operação

LP – Licença Prévia

MBR – Mineradoras Brasileiras Reunidas S/A

MPE – Ministério Público Estadual

MPF – Ministério público Federal

ONG – Organização não Governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

PAC – Programa de Ação Comunitária e Saneamento em Áreas de Baixa Renda

PLANASA – Plano Nacional de Saneamento

RIMA – Relatório de Impacto Ambiental

RMBH – Região Metropolitana de Belo Horizonte

SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

SINFRAJUPE – Serviço Interfranciscano de Justiça, Paz e Ecologia 

SINGREH – Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

UFMG – Universidade do Federal de Minas Gerais

UN-Habitat – Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos

UNV-PNUD – Programa dos Voluntários das Nações Unidas

SUMÁRIO

 

 

Introdução ------------------------------------------------------------------------------------------------- 8

Cap.1 – o Circuito das Águas --------------------------------------------------------------------- 13

1.1  - Água e meio urbano ----------------------------------------------------------------------------  13

1.2  - O histórico do abastecimento de água no município de Belo Horizonte ----------- 15

1.3  - O caso específico dos mananciais Mutuca, Fechos, Barreiro e Catarina --------- 19

 

Cap.2 - O Modelo desenvolvimentista, o minério de ferro e o caso de Capão Xavier ------------------------------------------------------------------------------------------------------21

2.1 - O modelo desenvolvimentista na política econômica e seus reflexos no meio ambiente: o contraste da Modernização Ecológica x Justiça Ambiental ----------------- 22

2.2 - O modelo desenvolvimentista em Minas Gerais: os deslocamentos do capital no setor minerário -------------------------------------------------------------------------------------------25

2.3 - O caso da Mina de Capão Xavier e as implicações sócio-ambientais trazidas pelo empreendimento ---------------------------------------------------------------------------------------- 27

 

Cap.3 – Estratégias e articulações dos sujeitos em disputa --------------------------- 38

3.1  - Estratégias e articulações em defesa das águas de abastecimento público ----- 38

3.2  - Estratégias e articulações a favor da exploração do minério ------------------------- 45

3.3  - A importância dos movimentos sociais na participação política --------------------- 49

 

Conclusão ----------------------------------------------------------------------------------------------- 51

 

Bibliografia ---------------------------------------------------------------------------------------------- 53

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Introdução

 

            Essa monografia foi elaborada a partir de um projeto mais amplo desenvolvido pelo Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (GESTA) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que vem, desde 2001, trabalhando em pesquisas relacionadas aos conflitos inerentes às diferentes racionalidades, lógicas e processos de apropriação do território na nossa sociedade (ZHOURI et al.: 2005a). Nesta perspectiva, o GESTA, a partir do ano de 2007, se engajou na elaboração de um mapa compreensivo dos conflitos ambientais[1] em Minas Gerais. Tal pesquisa possui um valor relevante, pois, além da importância dos casos e da carência de estudos nessa área, a necessidade de uma investigação como a que se propôs, torna-se ainda mais imperiosa quando se consideram as especificidades das formas históricas de apropriação das condições naturais territorializadas em Minas Gerais (Relatório Gesta: 2007)[2].

Envolvida com os trabalhos do Grupo desde meados de 2007, alguns casos específicos de conflito ambiental selecionados para serem inseridos no mapa em elaboração, me chamaram a atenção. Dentre eles estava o caso da implementação do empreendimento minerário da Mina de Capão Xavier pela Mineradoras Brasileiras Reunidas S/A[3]  (MBR) no município de Nova Lima, Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Por estar numa área muito próxima a Belo Horizonte, área esta que eu já havia visitado muitas vezes antes mesmo de saber o que se passava por ali, encontrei em Capão Xavier um caso que merecia um estudo ainda mais aprofundado do que o proposto pelo Gesta na pesquisa do “Mapa dos conflitos Ambientais no Estado de Minas Gerais”. Foi assim que iniciei minhas investigações a respeito de Capão Xavier e acabei me deparando com uma grande quantidade de material sobre o caso, já que ele foi, e ainda é, bastante discutido em vários meios como na imprensa, artigos, estudos, entre outros.

Localizada dentro da área de preservação ambiental de Mutuca e divisa adjacente com o Parque Estadual Serra do Rola Moça - Criado em 27 de setembro de 1994 (Decreto Estadual 36.071/94) - a Mina de Capão Xavier vem sendo explorada numa região onde se encontram quatro mananciais: Ribeirões de Fechos, Mutuca, Catarina e Barreiro, integrantes do sistema Alto Rio das Velhas (de acordo com a divisão da COPASA), responsável por parte do abastecimento de água de uso doméstico, comercial e de serviços dos municípios de Belo Horizonte e Nova Lima. Essa área de importância significativa para a região metropolitana não vem adquirindo destaque apenas em virtude dos últimos acontecimentos, mas sua importância já vem sendo discutida historicamente, desde a fundação do município de Belo Horizonte, que até meados da década de 60 ainda enfrentava sérios problemas relacionados ao abastecimento de água.

O desenvolvimento acelerado de grandes potências mundiais, como a China, vem proporcionando um forte aquecimento no setor de matérias primas para suprir suas necessidades internas de crescimento. O minério de ferro não fica para trás. O aumento da procura reflete no aumento do preço do produto e conseqüentemente na cobiça das mineradoras em adquirir cada vez maiores áreas de extração. No mercado brasileiro e principalmente em Minas Gerais, estado que já abriga muitos dos grandes empreendimentos minerários do país, esse cenário vinculado à política desenvolvimentista estimulada pelo governo atual (e global) - que vem lhe rendendo bons índices de aprovação e popularidade - não se intimida frente as potenciais destruições ambientais e a ampliação da concentração de renda, desde que se alcance com êxito o crescimento econômico e se elevem os índices de exportações.

 

(...) o discurso global em favor do desenvolvimento sustentável inscreveu, de fato, sociedade e desenvolvimento, numa concepção evolucionista e totalizadora de “crescimento econômico”. A “natureza” – considerada como realidade externa à sociedade e às relações sociais – foi convertida em uma simples variável a ser “manejada”, administrada e gerida, de modo a não impedir “o desenvolvimento” (ZHOURI, et al. 2005b, p.15).

 

No caso específico da Mina de Capão Xavier, a aprovação do licenciamento da área para o empreendimento da MBR pelo Conselho de Política Ambiental (COPAM), descumpre a aplicação de diversas leis estaduais e federais, sobretudo o descumprimento da Lei Estadual nº 10.793, de 2 de julho de 1992, que:Dispõe sobre a proteção de mananciais destinados ao abastecimento público no Estado” e em seu artigo 4º, inciso II, veda a “instalação, nas bacias de mananciais,[...] projetos ou empreendimentos que comprometam os padrões mínimos de qualidade das águas: atividade extrativa vegetal ou mineral”.

Diante do descumprimento das leis, e ainda, levando em consideração os prováveis prejuízos identificados pelos efeitos cumulativos da extração do minério de ferro na Mina de Capão Xavier, alguns segmentos sociais, opositores do empreendimento, se uniram num movimento único denominado “Movimento Capão Xavier Vivo[4]”. As iniciativas do Movimento já resultaram em duas recomendações encaminhadas ao Ministério Público, uma Ação Civil Pública contra a MBR, Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM), COPAM, Instituto Estadual de Florestas (IEF) e Prefeitura de Belo Horizonte, duas ações populares sendo uma na Justiça Estadual e outra na Justiça Federal, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com a finalidade de apurar as irregularidades do processo de licenciamento da MBR, uma denúncia da Mina de Capão Xavier apresentada a Organização das Nações Unidas (ONU), além da formulação de um site na internet com diversos artigos escritos sobre o caso e relatos de ações de protesto público, como caminhadas e abaixo-assinados.

Nesse panorama do Estado atrelado as concepções desenvolvimentistas e sua saga em busca de maiores taxas de crescimento econômico, os processos de licenciamento ambiental se tornam adaptáveis às nuances do capital à medida que este muda suas necessidades. O caso de Capão Xavier reflete nesse panorama, pois nele, observou-se a conivência das instituições públicas com a implementação do empreendimento, rompendo com um histórico de mais de cem anos de preservação de mananciais de abastecimento público. Diante desse fato, considerei de grande relevância o estudo mais aprofundado das articulações e estratégias da empresa MBR e do Movimento Capão Xavier Vivo, como maneira de apontar os diferentes sentidos atribuídos a um mesmo lugar, gerados pelos processos de desenvolvimento. O entendimento do abastecimento de águas ao longo da criação da capital mineira e uma análise do setor minerário nas esferas global e local, também enriquecerão a pesquisa aqui proposta, fazendo-nos entender os efeitos de determinados processos de globalização na localidade e as forças homogeneizantes dos mesmos na tentativa de minar as diferentes vivências de um mesmo território. Além disso, assumindo o lugar como não estático, o que permite “(...) uma consciência de suas ligações com o mundo mais amplo, que integra de forma positiva o global e o local” (MASSEY: 2000, p.184), será feita uma análise acerca das práticas e processos de resistência desencadeados por grupos locais que reconfiguram ativamente suas identidades, relações sociais e práticas econômicas, de maneira não se apresentarem como receptores passivos das condições transnacionais (ESCOBAR: 2005a).

Essa monografia tratará, portanto, da assimetria de racionalidades, contrastando a lógica hegemônica da “Modernização Ecológica” (BLOWERS: 1997), como a observada na MBR, que impõe a apropriação dos recursos naturais de maneira mercantilista e economicista, com a lógica da “Justiça Ambiental” (ACSELRAD: 2004), apropriada pelo Movimento Capão Xavier Vivo, que pressupõe a existência de outras “racionalidades sustentáveis” com o entorno, para além da apropriação produtiva da natureza. Esses conceitos irão colaborar com o entendimento dos sentidos de uso e significados projetados num mesmo território em disputa, onde de um lado se tem a MBR, mineradora interessada em extrair o minério de ferro que consiste num insumo importante para o mercado e suas dinâmicas de exportação, e do outro, o Movimento Capão Xavier Vivo composto por membros da sociedade civil de segmentos diversos, reunidos em prol de uma mesma causa, qual seja, da proteção às águas de abastecimento público dos mananciais existentes na área da mineração em questão.

 

Após uma leitura geral sobre o caso, questões a respeito dos “vícios” dos processos de licenciamento ambiental pelos órgãos responsáveis e também, sobre o crescimento acelerado do setor minerário no cenário global atual e o papel dos movimentos sociais como novos articuladores de políticas públicas, emergiram como problemáticas que precisariam ser melhor exploradas para compreender o caso de Capão Xavier. Assim, a execução desta monografia envolveu pesquisas teóricas referentes ao tema do meio ambiente, dos recursos hídricos e minerais e dos movimentos sociais, respaldada em autores como Acselrad, Martinez-Allier, Zhouri, Castro, Scherer-Warren, Escobar, além da pesquisa do material existente sobre o caso, reunido pelo próprio Movimento Capão Xavier Vivo tanto em formato impresso como em formato interativo, em site na internet.

Duas breves entrevistas com membros do Movimento Capão Xavier Vivo, Frei Gilvander e o jornalista Gustavo Gazzinelli, também foram fundamentais para a troca de informações sobre o caso, já que ambos, como pude perceber ao longo da pesquisa, são grandes colaboradores da causa, contribuindo com a elaboração de artigos e forte atuação na articulação de ações a favor da proteção dos mananciais de água e contrárias a exploração de minério pela MBR em Capão Xavier. Além dessas entrevistas, como parte das pesquisas realizadas para o Mapa dos Conflitos Ambientais no Estado de Minas Gerais, o GESTA realizou nos dias 27 e 28 de setembro de 2008, na Serra da Piedade, uma oficina com as entidades e movimentos sociais, para coletar informações e também contribuir com a articulação desses atores para ampliar o monitoramento das políticas ambientais do Estado, exercendo sobre elas maior influência. Nesta ocasião, a convite do Grupo de Estudos, Frei Gilvander compareceu e apresentou um relato sobre o histórico do caso de Capão Xavier o qual pude acompanhar na íntegra, uma vez que também estava presente na oficina.

Foram realizadas, ainda, uma visita de campo no local do Parque Estadual Serra do Rola Moça para coleta de material fotográfico e uma visita à sede da Vale do Rio Doce[5] (responsável pela MBR) em outubro de 2008, durante a qual pude assistir a vídeos explicativos e palestra sobre exploração do minério, responsabilidade ambiental da empresa nos locais de exploração e adjacências e sobre os projetos de recuperação das áreas dos empreendimentos ao final das explorações. Nesta mesma oportunidade, com mais um grupo de alunos do SENAC, percorremos a extinta mina de Águas Claras, localizada atrás da Serra do Curral aonde, atualmente, vem se formando um profundo lago no local da antiga cava de exploração. Também visitamos a Mina de Capão Xavier em pleno funcionamento. Nessa última, pudemos contar com a presença de um engenheiro da mina que se apresentava à disposição dos alunos para esclarecer quaisquer dúvidas ou curiosidades. Cabe ressaltar ainda que a visita à sede da empresa, assim como nas áreas de exploração, foram planejadas pela própria Vale, que oferece aos visitantes o transporte, material de divulgação da empresa, lanche e disponibiliza instrutores e engenheiros de seu quadro de funcionários para acompanharem a visita.

Quanto aos desafios da pesquisa, encontrei alguma dificuldade em analisar e sintetizar tudo que já havia sido publicado sobre o caso de Capão Xavier. Como o licenciamento da mina teve início no ano de 1998, desde então já se passaram dez anos da existência do caso, o que resultou na publicação de um volume considerável de material sobre o assunto, como: ações judiciais, notas da imprensa, artigos, relatos de ações em protesto, entre outros.

Desta maneira, minha proposta nessa monografia foi realizar um exercício analítico sobre um caso de luta pela água no cenário urbano como exemplo de conflito ambiental ocasionados pelos “grandes” projetos econômicos impostos por uma dada ordem hegemônica desenvolvimentista do mundo globalizado. A esse respeito, será discutido como os conflitos por água no meio urbano devem ser analisados como “(...) parte de uma confrontação social estrutural de caráter mais substantivo, vinculado à luta por superação das desigualdades qualitativas e quantitativas que impedem que (...) pessoas tenham acesso pleno as condições de vida civilizada[6]” (CASTRO: 2008a). A importância em aderir uma análise social ao estudo dos conflitos por água tem a finalidade de dar conta de seus processos físicos-naturais e sociais, e não apenas encarar tais conflitos como passíveis de soluções meramente técnico-burocráticas, defendidas historicamente pelos setores dominantes de governabilidade e gestão da água.

 

 

Cap.1 - O circuito das águas, um panorama global e local

 

A água encontra-se atualmente no centro da “questão ambiental”. Inclusive, segundo informações da ONU, a água promete ser no século XXI um dos bens mais preciosos para se determinar uma nação, tal qual foi o petróleo no século XX. Prevê-se ainda que no ano de 2025, a demanda por água seja ainda maior do que a vivenciada nos dias de hoje (Organização das Nações Unidas: 2003).

Mas, sendo a água um recurso natural essencial à vida e ao desenvolvimento econômico tanto em suas dinâmicas rurais, quanto urbanas, quais seriam os critérios de proteção e acesso a esse recurso?

Como essa monografia se dedica ao estudo de caso da exploração de minério em um local próximo ao município de Belo Horizonte, e sendo essa exploração situada exatamente numa área onde se concentram alguns dos mananciais de água que abastecem parte da cidade, tratarei na sessão a seguir, sobre noções elementares que dizem respeito aos recursos hídricos urbanos, a fim de compreendermos melhor as dinâmicas das águas urbanas tanto num plano mais geral, como no caso da RMBH e a área específica da Mina de Capão Xavier.

 

 

1.1  - Água e meio urbano

 

De acordo com dados do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos, UN-Habitat, em 2007, pela primeira vez, a população urbana ultrapassou a rural em níveis mundiais. Os centros urbanos em que vive essa população, por sua vez, em sua grande maioria, têm como característica fundamental uma boa disponibilidade de água, já que a proximidade homem-água nos centros urbanos significa mais do que ter o essencial para a vida, mas também uma busca por melhores condições de saúde pública, como o acesso facilitado a redes de saneamento e melhores condições de salubridade. Além desses fatores, a água representa um precioso insumo para diversas atividades econômicas, grande parte delas desenvolvidas em áreas urbanas.

Porém, ao contrário do que se espera, a urbanização sobre o ciclo-hidrológico resulta na impermeabilização do solo[7], na diminuição da disponibilidade efetiva de água doce, além do aumento dos custos desprendidos pelos poderes públicos destinados ao manejo das águas, mas que nem sempre se estendem a todas as camadas da população. E para aqueles que se estende, presume-se que uma vez que tenham sido beneficiados, paguem pelos custos e facilidades concedidas. É sabido ainda que as águas de boa qualidade para o consumo não possuem acesso facilitado e por isso, cada vez mais, a captação de “boa água” tem se dado em lugares mais longínquos e profundos, acrescentando com isso os custos dessa captação, os quais são repassados para os usuários.

De acordo com o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, o acesso a água, seus serviços essenciais e o saneamento são direitos humanos fundamentais[8]. Para Esteban Castro, tal consideração ”representa uma reafirmação de vertentes culturais universalistas, que combatem as formas mais extremas do mercantilismo e do neoliberalismo como princípios ordenadores do sistema social[9]” (CASTRO: 2005a). Porém, “o acesso à água na quantidade e qualidade suficientes à vida”, que deveria “ser reconhecido como um direito institucional humano e social” (PETRELLA: 2004, p.24) vem, por sua vez, diminuindo ao longo dos anos.

No âmbito brasileiro, segundo a Constituição de 1988, as águas pertencem à União (art. 20, III) ou aos Estados (art. 26, I) dependendo da sua localização e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) - determinação constitucional, prevista no artigo 21, inciso XIX. Em 8 de janeiro de 1997, uma nova lei foi promulgada com a finalidade de adequar a constituição a especificidades do acesso a água. Assim sendo, a Lei nº. 9.433 instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Segundo essa Lei, as águas devem ser tratadas como recurso natural limitado, com valor econômico e de domínio público, o que significa que seu uso está condicionado à mediação do Estado e deve ser gerido de forma descentralizada, podendo inclusive incidir cobrança pela utilização.

O que observamos, no entanto, é que o modelo de governabilidade centrado em princípios mercantilistas[10] observado na atualidade, faz uso da lei, dentro do discurso democrático, para definir os critérios do acesso a água, excluindo de suas decisões a participação dos cidadãos no exercício de seus direitos fundamentais. Ou seja, “a necessidade de introduzir princípios de racionalidade econômica para melhorar a gestão dos recursos e dos serviços de água e saneamento foram confundidos com a introdução da racionalidade mercantil (...) que inverte a ordem dos valores e transforma em fim o que deveria ser o instrumento”. (CASTRO: 2005b). Nesse contexto, os benefícios relacionados a água são tratados como mercadoria e o cidadão como um mero consumidor, o que termina por agravar os problemas de acesso a água, excluindo de sua agenda os menos favorecidos economicamente, restringindo os direitos básicos a cidadania e aumentando a desigualdade social.

Apesar das propostas políticas do Estado de ampliação de projetos de políticas públicas às camadas menos favorecidas, o alcance dessas políticas ainda é baixo nos planos temporais e territoriais, uma vez que estão sempre sujeitos as intempéries do contexto sócio-político-econômico, que normalmente se adequa às imposições do mercado em detrimento dos princípios democráticos de “(...)(universalidade, eqüidade, integralidade, qualidade, acesso, sustentabilidade ambiental), ao meio de atingi-los (fortalecimento do poder local, intersetorialidade) e a atributos correspondentes a ambas dimensões (participação e controle social)” (HELLER, CASTRO: 2007). Nesse sentido, a visão mercantilista aplicada aos serviços de acesso a água inverte a ordem de valores, colocando em segundo plano os princípios de direito social e cidadania, para exaltar o caráter comercial desses serviços, onde a participação do cidadão se resume a obediência e sua capacidade de pagar pelos benefícios recebidos (CASTRO: 2008b).

 

 

1.2  - O histórico do abastecimento de água no município de Belo Horizonte

 

A escolha de Belo Horizonte para sediar a capital mineira esteve fortemente relacionada a acessibilidade à água. O engenheiro nomeado para o estudo das possíveis localidades onde se construiria a capital, Aarão Reis, deveria reconhecer a disponibilidade de água em termos de abundância de água potável, em termos de quantidade e qualidade e ainda, de condições naturais de salubridade. Esse último estava relacionado a “concepção higienista do século XIX“ que “entendia o saneamento e a salubridade como envolvendo esses aspectos diversos do ambiente físico, considerando-os como requisitos básicos de saúde pública. Hoje a noção de ambiente saudável e de qualidade de vida nas cidades se amplia significativamente, e o saneamentos passa a ser enquadrado dentro do conjunto dos direitos de cidadania” (Fundação João Pinheiro: 1997a, p.34).

            Dado início às obras da capital de Minas em fins do século XIX, nota-se, portanto, a conformidade do projeto desenvolvido aos princípios de urbanização herdados da revolução científica e industrial européia. Esses princípios seguiam uma linha positivista, fundamentada no papel do Estado como impulsionador do progresso.

            Nessa lógica, nota-se uma preocupação constante da comissão construtora da cidade em traçar as vias e instalações futuras já interligadas a sistemas de abastecimento e saneamento. Assim, a primeira etapa do projeto de abastecimento de água da cidade inicia prevendo a construção dos reservatórios: Serra; Cercadinho - atual Carangola (que ainda não tinha sido terminado com a inauguração da cidade); Palácio e um de extremidade (que nunca chegou a ser construído). Posteriormente em 1896, é realizado o rebaixamento do canal do ribeirão arrudas e iniciada a construção do canal do córrego do Acaba-Mundo (também tendo suas obras incompletas na inauguração da cidade). (Fundação João Pinheiro:1997b, p.66).

            Contudo, com uma população crescente, esse sistema de captação de águas e esgotamento sanitário já se mostra insuficiente e de difícil operação logo nos primeiros anos da cidade, que em 1903 já cobrava tarifas para o fornecimento com base em medidores. Surge assim, a necessidade de se fazer novos estudos de córregos, para a construção de novos reservatórios. Nessa mesma fase, os primeiros efeitos da urbanização começaram a se fazer visíveis e as águas de alguns dos reservatórios já existentes, começaram a diminuir, o que levou a prefeitura a agir com maior precaução em relação às matas protetoras dos mananciais, com fins de combater a escassez de água.

 

Em 1930, no Relatório Geral dos Serviços do Novo Abastecimento D’Água de Belo Horizonte, pelo chefe dos serviços, Octacílio Negrão de Lima, que - informando sobre a situação do abastecimento regular de água da cidade - diagnosticava patentear-se a clara “necessidade de aduzirem-se novos mananciais para a população da cidade” e que “ao lado da situação precária da população existente, forçoso se tornava considerar o aumento daquela [população], dia a dia crescente. A solução do problema não se podia limitar ao estado atual. Seria uma solução infeliz a que debelasse o mal apenas no presente. Cumpria abastecer a população até aqui desprovida de água e abrir à cidade ampla possibilidade de progresso”, e “projetar o serviço da nova captação, na previsão do desenvolvimento da Capital, até o ano de 1950; (GAZZINELLI: 2003a, p.2)

 

Ainda assim, desde a fundação da cidade até meados da década de 60, Belo Horizonte passaria por vários momentos de crise de abastecimento combinados a períodos de seca com outros de enchentes, ao mesmo tempo em que a cidade aumentaria consideravelmente em tamanho físico e em número de habitantes. Principalmente no que diz respeito às vilas e favelas, que não eram beneficiadas pelos sistemas de acesso a água e redes de esgotamento, a situação chegou a um a nível bastante precário. Nesse mesmo período, muito se falou a respeito de novas possibilidades de captação de água e por volta da década de 50 já se reconheceria a importância dos ribeirões Mutuca e Fechos (em Nova Lima) como fontes solucionadoras dos problemas de abastecimento que assolavam a cidade. Em 1956 mais precisamente, no Relatório apresentado à Câmara Municipal, o Prefeito Celso Mello de Azevedo citava várias providências a serem tomadas, como por exemplo:

 

A conclusão das desapropriações das ‘terras marginais aos córregos do Mutuca e Fechos’, à St. John Del Rei Mining Company Ltda, pela quantia de Cr$16.500.000,00, a assinatura de contrato com a Companhia Ferro Brasileiro “num total superior a Cr$ 12.000.000,00, para fornecimento de encanamentos que servirão, em sua maior parte, à conclusão de adutora que ligará a adutora de Fechos ao reservatório de Morro Redondo. (GAZINELLI: 2003b, p.5).

                       

            É então no ano de 1966 que se iniciam as negociações com o Banco Nacional de Desenvolvimento (BID) para pedido do empréstimo destinado as obras de melhoramentos dos serviços de água e esgoto. A partir de então, ainda que tenham existido atrasos na liberação do dinheiro, muitas obras de infra-estrutura são iniciadas na cidade, dentre elas, o grande Sistema Rio das Velhas, finalizado em 1972[11]. Com o regime militar, a política de saneamento adota uma postura centralizadora das decisões e recursos onde “(...) privilegia-se a capacidade de investir das instituições provedoras de serviços, em detrimento da capacidade aquisitiva das populações”. (Fundação João Pinheiro: 1997c, p.211). E em 1971 essa estratégia é reforçada com a criação do Plano Nacional de Saneamento (PLANASA).

            Mais adiante, com a intenção de reformar o planejamento no âmbito metropolitano, é criada uma autarquia municipal de água e esgotos, pelo órgão estadual responsável por esses serviços, que em 1974 já se denominava COPASA - MG (Companhia de Saneamento de Minas Gerais). O ingresso da COPASA em nível metropolitano representaria um aprimoramento do pessoal de operação e equipamentos utilizados nos sistemas de água e esgoto, a introdução de um laboratório central de análises de água, obras de melhoramento dos sistemas de captação de águas, descentralização dos serviços de obras e atendimento aos usuários e, dentre outras melhorias, o reajuste nas tarifas cobradas aos consumidores, fundamentais para a auto-sustentação da companhia de saneamento.

            Com o passar dos anos, a preocupação ambiental efetiva também passou a fazer parte da agenda do Poder Público, e, no contexto da implantação do Sistema de Abastecimento de Água Serra Azul – na Bacia do Alto Paraopeba, no município de Paraopeba / RMBH – foi decidido que: a “(...)bacia hidrográfica foi considerada como área especial” e por isso “declarada como área de preservação permanente a vegetação natural ali existente (LEI nº6.766, de 19 de dezembro de 1979)”. (Fundação João Pinheiro: 1997d,  p.247).

            Chegando então a década de 90, foi inaugurado o Sistema Rio Manso – no município de Rio Manso / RMBH – completando o quadro de distribuição de águas tratadas para o município de Belo Horizonte. Nessa fase, com o crescimento da população já mais regularizado em comparação às décadas anteriores, a COPASA passou por uma fase de modernização de sua estrutura, no sentido de ampliar o monitoramento da qualidade das águas distribuídas, desde sua captação até seu despejo nos córregos e rios. Além disso, a companhia, em conjunto com a prefeitura da cidade, iniciou o Programa de Ação Comunitária e Saneamento em Áreas de Baixa Renda (PAC’s), com a finalidade de construir um diálogo maior com as comunidades a serem atendidas e as prioridades de atuação.

            Esse breve histórico do abastecimento de água de Belo Horizonte demonstra até aqui os dilemas enfrentados pela população da cidade e do Poder Público ao longo da formação da capital mineira. Cabe ressaltar ainda que:

 

O grande crescimento populacional e urbano que acompanhou o período favoreceu também – em meio à febre do Milagre Econômico e à carência de instrumentos legais de salvaguarda dos direitos difusos – aos interesses incorporadores e imobiliários, que lançaram mão dos mais variados meios de pressionar detentores de funções ou cargos públicos que pudessem interferir na gestão de seus negócios (GAZINELLI: 2003c, p.8).

 

 

 

 

 

1.3  - O caso específico dos mananciais Mutuca, Fechos, Barreiro e Catarina

 

Como já foi mencionado na sessão anterior, na década de 50, o Poder Público belorizontino começou a demonstrar sua incipiente preocupação ambiental e reconheceu a importância dos mananciais de Mutuca e Fechos como fontes solucionadoras dos problemas de abastecimento que assolavam a capital. Mais adiante, reconheceu-se também a importância dos mananciais Barreiro e Catarina, que viriam a ser pólos de captação de águas para o abastecimento dos bairros Barreiro e Cidade Industrial.

A importância histórica dos quatro mananciais presentes na atual área da Mina de Capão Xavier (Mutuca, Fechos, Barreiro e Catarina), portanto, sempre esteve diretamente relacionada ao abastecimento de água da cidade de Belo Horizonte. Isso, devido a localização próxima e estratégica dos mananciais ao centro urbano e também, devido a qualidade especial de suas águas (Foto1).

 

 

Foto 1: Localização da Mina de Capão Xavier (no bairro Jardim Canadá) e sua proximidade em relação ao centro da capital mineira.

           Foto: Imagem de satélite do Google Earth.

 

 

Atualmente, os mananciais dos ribeirões Mutucas e Fechos alimentam o Sistema Morro Redondo da COPASA, inaugurado em 1958, e são responsáveis pelo abastecimento de boa parte da zona sul de Belo Horizonte. Já os mananciais dos ribeirões Catarina e Barreiro fornecem água para a região do Barreiro e condomínios de Brumadinho, na região metropolitana. As águas desses ribeirões estão resguardadas por um ecossistema complexo, por se localizarem numa zona de transição de Cerrado para Mata Atlântica composto por vegetação diversificada, além de animais adaptados a esse complexo. A formação geológica do solo local composto por ricos campos ferruginosos e de altitude, dão o aspecto poroso que funciona como um filtro natural para as águas que ali se abrigam. As águas captadas nessas condições são consideradas as de melhor qualidade e por isso, classificadas de classe especial[12], ou seja, destinadas ao abastecimento doméstico. 

Por todas essas razões, esta área foi declarada ainda na década de 80 pelo Governo Estadual, como Área de Proteção Especial[13] de acordo com os decretos Estaduais nºs. 22.327/82, 21.372/81, 22.091/82 e 22.096/82. E na década de 90, a mesma área, foi declarada como área de proteção ambiental segundo os termos do artigo segundo do Decreto de nº. 35.624/94, 37.812/96 e da Lei Estadual 13.960/2001 que prevê sobre a área:

 

Tem por objetivo proteger e conservar os sistemas naturais essenciais à biodiversidade, especialmente os recursos hídricos necessários ao abastecimento da população da região metropolitana de Belo Horizonte e das áreas adjacentes, com vistas á melhoria da qualidade de vida da população local, à proteção dos ecossistemas e ao desenvolvimento sustentável.

 

Mais adiante, em 1994, os governadores Hélio Garcia e Itamar Franco criaram a Estação Ecológica de Fechos - que abrange os mananciais de Mutuca e Fechos - cuja intenção expressa em lei, era proteger as nascentes hídricas ali existentes, tal quais as formações arqueológicas (como grutas e sítios) de grande valor histórico e científico segundo o Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico (IPHAN) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). Também instituíram o “Parque Estadual Serra do Rola Moça” em 1994, para contribuir com a preservação dos mananciais de Catarina e Barreiro, bem como o complexo natural ali existente.

Os aspectos acima apresentados demonstram que a instalação de qualquer empreendimento nessas áreas, além de causar impactos ao ecossistema local, estará infringindo as Leis e Decretos que protegem os mananciais de água destinados ao abastecimento da população da RMBH. Principalmente no que diz respeito à extração do minério de ferro, os danos causados podem ser irreversíveis, uma vez que a existência de tais mananciais depende do solo composto pelo minério e, tal exploração pode acarretar na redução da vazão, colocando em risco a quantidade de águas captadas e também a qualidade especial dessas águas.

 

 

 

 

Cap.2- O Modelo desenvolvimentista, o minério de ferro e o caso de Capão Xavier

 

Até aqui se tratou da questão da água e de como o poder público lidou com a preservação dos mananciais de abastecimento da população ao longo da fundação da capital mineira. Na última sessão do capítulo anterior, um enfoque maior foi destinado aos quatro mananciais que se encontram na área referida da mineração de Capão Xavier, que desde meados do século passado já eram considerados de importância fundamental para a Região Metropolitana de Belo Horizonte devido a sua proximidade em relação aos centros urbanos e principalmente, pela boa qualidade de suas águas.

Neste capítulo, no entanto, o enfoque se concentrará sob o entendimento do modelo desenvolvimentista e o enquadramento, neste modelo, da utilização do outro recurso natural presente na mesma área analisada: o minério de ferro. Este último, que na maioria dos casos tem sua formação geológica vinculada à existência da água, também se constitui como um recurso importante, não pelo fato de ser fundamental para existência humana como é o caso da água, mas principalmente por seu valor de mercado no âmbito do modelo econômico assumido estrategicamente pelo estado de Minas Gerais, dentro do panorama maior de projeto desenvolvimentista  adotado no Brasil.

Os recursos naturais acima mencionados fazem parte de um cenário de apropriações distintas de sujeitos que se situam de forma desigual e assimétrica na estrutura social. Este cenário demonstra não apenas uma disputa de interesses de atores, onde se negocia a apropriação menor ou maior de certos recursos naturais, mas muito mais do que isso, evidencia os distintos vínculos estabelecidos entre os sujeitos com território, através dos sistemas simbólico/cultural e das relações produtivas, numa tentativa de definir a escala de valores e direitos humanos que deveriam ser tomados como primordiais.

Em virtude da intensificação da produção e exportação de commodities, Minas Gerais vem vivenciando uma mercantilização de seu território, que contribui para o agravamento desse cenário de assimetria e a emergência de conflitos ambientais. A esse respeito ressaltam ZHOURI e ZUCARELLI:

 

Estes conflitos evidenciam os diferentes processos de construção territorial, bem como salientam as formas de uso do espaço praticadas por distintos grupos sociais. A ocorrência dos conflitos remete, então, a situações de desigualdade no acesso aos recursos naturais e a desproporcionalidade na distribuição dos riscos gerados pelos processos de desenvolvimento (2008a, p.1).

 

 

Para entendimento desse panorama, este capítulo se dividirá em três sessões. A primeira é destinada à reflexão a respeito do modelo desenvolvimentista adotado pela política econômica global e também brasileira, através da comparação das noções antagônicas de “Modernização Ecológica” e “Justiça Ambiental”. A segunda, por sua vez, se dedicará ao entendimento dos fluxos do capital no que diz respeito a extração do minério de ferro, focalizando o estado de Minas Gerais. E para completar o capítulo, a terceira a última sessão tratará do histórico do caso da Mina de Capão Xavier, inferindo sobre esse histórico uma análise crítica relativa às temáticas abordadas anteriormente, quais sejam, do modelo desenvolvimentista, os fluxos do capital, a justiça ambiental, a preservação das águas, etc.

 

 

2.1 - O modelo desenvolvimentista na política econômica e seus reflexos no meio ambiente: o contraste da Modernização Ecológica x Justiça Ambiental

 

Questões relativas ao crescimento econômico e impactos ambientais são hoje temas muito recorrentes em encontros internacionais e acordos de cunho econômico ou mesmo social celebrados entre os países ao redor globo. E estas questões, muito embora envolvam soluções complexas e nem tão favoráveis ao setor econômico, são sempre decididas segundo a lógica desenvolvimentista, onde os possíveis antagonismos de interesses se resolvem através de “políticas modernizantes”.

A noção de “desenvolvimento”, segundo explica SACHS e ESTEVA, passou a ser aplicada no período do pós-guerra pelo mundo ocidental para diferenciar os países em termos de seu grau de crescimento e avanço industrial. Sob essa ótica, que perdura até os dias atuais, os países mais avançados industrialmente são capazes de concentrar mais recursos e, portanto, se manterem a frente de outros países considerados mais atrasados.

O desenvolvimento não consegue se desassociar das palavras com as quais foi criado: crescimento, evolução, maturação. Da mesma forma, os que hoje usam a palavra não conseguem libertar-se de uma teia de significados que causam uma cegueira específica em sua linguagem, pensamento e ação. (...) A palavra sempre tem um sentido de mudança favorável, de um passo do simples para o complexo, do inferior para o superior, do pior para o melhor. Indica que estamos progredindo porque estamos avançando segundo uma lei universal necessária e inevitável, e na direção de uma meta desejável. (ESTEVA: 2000, p.64).

 

No caso brasileiro, por estarmos enquadrados no bloco dos países do sul de desenvolvimento tardio e de maior atraso econômico, o modelo da “modernização conservadora[14]” foi aqui adotado com a finalidade de utilizar recursos estratégicos que reduzissem essa defasagem. Esse modelo pressupõe uma forte presença do Estado como regularizador da economia e promotor dos “interesses gerais” da sociedade, através da imposição aos demais setores sociais, dos interesses das classes integradas na coalizão dominante, tipicamente composta pelas elites.

Assim, com a finalidade de organizar a recuperação do crescimento brasileiro, a transferência do modelo de modernização conservadora para os estados membros do sistema nacional pressupôs a administração dos recursos naturais estratégicos, para o tipo de desenvolvimento pretendido para cada região. Nessa perspectiva do Estado como mediador das condições naturais do país, em graus variados, os elementos naturais podem ser utilizados, ora como recursos intrínsecos a saúde humana, lazer ou apreciação, ora como matérias primas, mercadorias, fontes de energia e outras funções que atendam as demandas do desenvolvimento.

Considerando que os processos de modernização seguem um curso relativamente homogêneo, ao examinar a experiência brasileira, notamos que a gestão dos recursos vinculada ao desenvolvimento econômico culminou, tal qual nos países já “desenvolvidos”, na emergência de uma política ambiental. Esta última se assenta na busca da:

(...) compatibilização entre, de um lado, os usos das condições naturais do território (...) como condições de produção de mercadorias e, de outro, a preservação de suas qualidades como condição para a vida, estabelecendo “parâmetros técnicos” para mitigação de impactos ambientais de atividades “produtivas”, criando áreas de preservação exclusiva ou de uso produtivo gerenciado, etc. (CARNEIRO: 2003a, p.138).

 

Tal qual foi descrita acima, a política ambiental adotada pelo modelo de modernização conservadora é atualmente encaixada na noção de “desenvolvimento sustentável”. Essa noção, juntamente com outras, quais sejam: “‘eficiência’, ‘capacidade competitiva’, ‘níveis de produtividade’ etc, (...) tendem a legitimar e reforçar a superioridade real e simbólica dos dominantes” (ACSELRAD: 2004a, p.16). A noção de desenvolvimento sustentável, desse modo, se encobre de justificativas ecológicas para legitimar a racionalização do território, via soluções técnicas[15], próprios dos setores dominantes, que excluem as demais apropriações simbólicas de um determinado lugar. “Neste processo, a ‘natureza’ é entendida meramente como uma variável a ser manejada, administrada, gerida, na velha tradição racionalista burocrática e iluminista, de tal forma a não obstaculizar a concepção hegemônica de ‘desenvolvimento’’” (ZHOURI: 2004).

Assim, o desenvolvimento sustentável, com as dinâmicas que lhe são próprias, instituiu um novo modelo contemporâneo de modernização amparado pela lógica desenvolvimentista: a “Modernização Ecológica”.  Esta se constitui como processo de incorporação de preocupações ecológicas pelas instituições políticas, no propósito de conciliar o crescimento econômico com a resolução dos problemas ambientais, enfatizando a adaptação tecnológica e a eficiência industrial, à celebração da economia de mercado, à crença na colaboração e no consenso. (BLOWERS: 1997).

 Contudo, a hegemonia desse modelo entra em tensão quando ordens e relações sociais se manifestam contrárias a ele e passam a disputar um mesmo ambiente. Neste momento se instituem os chamados “conflitos ambientais”, definidos por Henri Acselrad por:

 

Aqueles envolvendo grupos sociais com modos diferenciados de apropriação, uso e significação do território, tendo origem quando pelo menos um dos grupos tem a continuidade das formas sociais de apropriação do meio que desenvolvem, ameaçada por impactos indesejáveis – transmitidos pelo solo, água, ar ou sistemas vivos – decorrentes do exercício das práticas de outros grupos (2004b, p.26).

 

Esses conflitos podem ser posicionados segundo quatro dimensões constitutivas, são elas: “apropriação simbólica e apropriação material, durabilidade (da base material necessária à continuidade de determinadas formas sociais de existência) e interatividade (ação cruzada de uma prática espacial sobre outra) – que seriam essenciais para apreender a dinâmica conflitiva própria aos diferentes modelos de desenvolvimento (ACSELRAD: 2004c, p.26).

Embora mantenham uma posição crítica frente à prática da Modernização Ecológica vigente, quando não fazem parte da coalizão dominante, os sujeitos envolvidos nas disputas dos conflitos ambientais, se vêem fragilizados e despolitizados pelas instituições públicas e setores econômicos, por não estarem devidamente organizados ou não terem o domínio da linguagem técnica necessária para apontar, nestes termos, as situações de desigualdade ambiental. Nesse contexto, recorre-se a noção de “Justiça Ambiental”. Nascida nos Estados Unidos dos anos 80, a noção de Justiça Ambiental evidencia situações de injustiça social aos processos de degradação ambiental, fundindo os direitos civis às preocupações ambientais. Assim, organizam “(...) as populações para exigir políticas públicas capazes de impedir que também no meio ambiente vigorem os determinantes da desigualdade social e racial” (ACSELRAD: 2004d, p.28).

Diante da falta de um ator social fixo, o que se observa é um meio ambiente submetido aos deslocamentos do capital, ou seja, forçado a se sujeitar às condições favoráveis aos grandes empreendimentos que lhe pretendem fazer uso. Neste quadro, as diversas lutas por justiça ambiental aparecem como barreiras políticas frente a essas práticas, por manterem-se como questionadoras da distribuição desigual do meio ambiente, da degradação ambiental e das injustiças sociais.

 

 

2.2  O modelo desenvolvimentista em Minas Gerais: os deslocamentos do capital no setor minerário

 

Como observado no primeiro capítulo da presente monografia, o estado de Minas Gerais, no momento da criação de sua capital, esteve associado às metas desenvolvimentistas e de crescimento industrial, seguindo uma lógica positivista. Essa estratégia estava vinculava às aspirações da lógica modernizante que norteavam e ainda norteiam a política nacional. 

Apesar do processo histórico das “Minas Gerais” ter sido traçado as margens das valiosas minas de ouro e diamante, foi apenas no início do século passado que o governo federal demonstrou um interesse concreto pelas reservas minerais por aqui encontradas. Tal interesse estava também vinculado à divisão espacial dos recursos naturais, sendo que após estudos geológicos mais elaborados, o estado de Minas ganhou destaque por apresentar grande potencial em recursos minerais. Assim, incentivados por uma política de exportação para alavancar o desenvolvimento da siderurgia nacional, as jazidas de minério de ferro e de manganês do Quadrilátero Ferrífero[16] mereceram a atenção do capital, da indústria e da classe política mineira.

Ainda que os mananciais de água estejam vinculados às jazidas ferríferas, até meados da década de 50 este patrimônio natural ainda não havia sido significativamente afetado, mantendo-se preservado e afastado de problemas maiores, como foi o caso da capital mineira, que por volta dessa mesma data, ainda mantinha os recursos naturais de suas proximidades preservados e distanciados dos processos de exploração mineral.

Contudo, os procedimentos de organização política e econômica vinculados as regulamentações do capital internacional, direcionaram a política de industrialização em Minas. É então que a partir da década de 60 o setor da minero-siderurgia foi definido como de importância essencial não só para o próprio estado de Minas, como também para os interesses do país “(...) revestindo-se de conteúdo estratégico alusivo a segurança nacional” (DULCI: 1999b, p.207). A respeito dessa participação de Minas no processo industrial brasileiro, explica CARNEIRO:

 

A atividade mineradora economicamente mais importante para o estado é, de longe, a extração e beneficiamento do minério de ferro, que se torna mais intensa a partir dos anos 1960, quando, movido pelo ímpeto de ampliar os saldos da balança comercial com vistas ao financiamento dos grandes projetos nacionais de industrialização e de criação de infra-estrutura, o governo federal abre o setor ao capital estrangeiro. Por essa época, instalam-se na região central de Minas as grandes mineradoras (SAMITRI, SAMARCO, MBR, etc.) que, acompanhando o ciclo de expansão do complexo industrial “fordista” mundial e nacional, impulsionarão a extração de, literalmente, montanhas de minério de ferro, em quantidades crescentes até o ano de 1977 (2003b, p.138 e 139).

 

 

No final da década de 70, apesar da forte retração da economia mundial, acentuada pela diminuição do crescimento, a mineração continuou como atividade fundamental para a economia brasileira, “(..) gerando divisas para a formação de superávites que permitissem o pagamento de juros e serviços da dívida pública” (CARNEIRO: 2003c, p.318).

Atualmente, com o reaquecimento do crescimento econômico mundial, principalmente de potências como a China[17] e a Índia e, a crescente integração das economias regionais em escala global, o setor minerário não só apresentou grande aumento nas suas exportações, como também aumentou suas influências sob o estado de Minas Gerais e outras partes do país, se engajando na busca de novas áreas de exploração[18]. Essa empreitada apoiada pela política desenvolvimentista nacional e amparada pelas facilidades de regulamentação dos empreendimentos concedidas pelos órgãos ambientais, permite que os acessos facilitados aos recursos naturais, independente dos prejuízos que possam trazer ao meio ambiente e a sociedade, estejam disponíveis para as demandas do capital.

Nesse panorama, no estado de Minas as áreas de mineração não só se multiplicaram por todo o território, como passaram a ser vizinhas dos aglomerados urbanos, se apropriando de áreas já territorialmente significadas e apropriadas por outros segmentos sociais ou até mesmo, protegidas ambientalmente contra tal tipo de apropriação do solo (como no caso de Capão Xavier). Nesses locais foram instalados empreendimentos de grande porte, que tem sua atividade legitimada pelo discurso de serem áreas importantes para os “interesses da nação”, assim como pelas soluções técnicas-científicas incentivadas pelo desenvolvimento sustentável, o que vem permitindo a adaptação do meio ambiente aos projetos econômico-industriais.

 

 

2.3  - O caso da Mina de Capão Xavier e as implicações sócio-ambientais trazidas pelo empreendimento

 

O histórico do caso de Capão Xavier representa um caso emblemático de conflito ambiental por envolver uma “(...) desproporcionalidade na distribuição dos riscos gerados pelos processos de desenvolvimento” (ZHOURI e ZUCARELLI: 2008b, p.2). As pretensões de significados e usos do meio ambiente são aqui colocadas em disputa, envolvendo não só os elementos centrais: água e minério de ferro, mas também a fauna e a flora local, além da questão principal do direito ao abastecimento de água da população da RMBH.  Ou seja, o caso de Capão Xavier não traz a tona apenas a disputa por recursos “físicos ambientais”, exalta também as distintas lógicas de práticas ecológicas e econômicas adotadas no lugar, que emergem do enfoque desenvolvimentista adotado pela política ambiental brasileira. Isso faz como a concepção do lugar se relacione a aspectos mais amplos, sejam eles: as relações sociais; os impactos da economia; a identidade; etc, levando em consideração também a questão: Qual direito deveriam prevalecer sobre o outro, o direito da água de abastecimento da população ou o ferro para exportação?  

 

Capão Xavier é um empreendimento das Minerações Brasileiras Reunidas (MBR), “(...) localizada a noroeste da província mineral do Quadrilátero Ferrífero, estado de Minas Gerais, Brasil. A área (...) é delimitada pela bacia hidrológica formada a partir das microbacias dos córregos Seco e dos Fechos, com aproximadamente 16 km2 de área superficial e altitude variando entre 1.500 e 1.100 metros, estando situada a 15 km a sul do município de Belo Horizonte, nos domínios do bairro Jardim Canadá” (LAZARIM e LOUREIRO: s/ data, a), que conta com uma reserva de 173 milhões de toneladas de minério de alto teor de ferro, uma das últimas reservas de alto teor do Quadrilátero Ferrífero, com previsão de exploração de vinte e dois anos, com 8 milhões de toneladas/ano, representando 20% da produção da empresa (dados do EIA-RIMA de Capão Xavier) / (Foto 2). A mina entrou em operação no segundo semestre de 2004, após o Tribunal de Justiça ter derrubado liminar de 1ª instância que impedia o seu funcionamento, e depois de várias reuniões da Comissão de Meio Ambiente na Assembléia, com técnicos, representantes do Ministério Público e moradores da região. Tais discussões, inclusive, motivaram a formação da CPI no mesmo ano de 2004.

 

Foto 2: Vista panorâmica da Mina de Capão Xavier, nos domínios do bairro Jardim Canadá.

          Foto da autora, 22/10/2008

Este empreendimento teve seu licenciamento aprovado pela FEAM, COPAM e ainda, o apoio, através da celebração de convênios que facilitaram seu funcionamento, com a Prefeitura de Belo Horizonte, COPASA, IEF, dentre outros órgãos. A cronologia do processo de licenciamento pode ser acompanhada a seguir[19]:

 

Cronologia

Março – 1998 – MBR protocolou junto à FEAM a solicitação de Licença Prévia (LP) para a exploração de minério de ferro, na jazida denominada Capão Xavier, situada no município de Nova Lima, próximo ao bairro Jardim Canadá, às margens da BR-040.

Fevereiro – 2000 – após normalização do processo, foi realizada vistoria no local pela equipe multidisciplinar da FEAM, quando a mineradora comunicou modificações consideráveis nos Estudos de Impacto Ambiental (EIA) e, conseqüentemente, no Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). Ficou decidido, em comum acordo entre a FEAM e a MBR, a necessidade de apresentação de um estudo consolidado que incorporasse as modificações, ficando a análise do referido processo suspensa até a apresentação do mesmo à FEAM.

Agosto – 2002 – MBR protocolou novo EIA-RIMA, contemplando as modificações do projeto original e em setembro de 2002, novamente publicou o requerimento da licença junto à FEAM.     

Março – 2003 – realização de Audiência Pública na Regional Noroeste da Prefeitura de Nova Lima, situada no bairro Jardim Canadá.

Agosto – 2003 – MBR obteve junto ao COPAM a Licença Prévia (LP) com 38 condicionantes.

Outubro – 2003 – MBR solicitou Licença de Instalação (LI).

Dezembro – 2003 – Concedida pelo COPAM a LI com 30 condicionantes.

Janeiro – 2004 – MBR solicita a LO para a Mina de Capão Xavier.
Março – 2004 – LO é concedida pelo COPAM com 34 condicionantes (entre elas o monitoramento contínuo dos recursos hídricos, resgate e salvamento de fauna e flora, além da definição do período de desmonte com explosivos, que poderá ocorrer somente entre 10h e 12h ou entre 14h e 16h).

O local explorado é uma jazida de minério de ferro localizada numa área vizinha ao bairro Jardim Canadá (Foto 3) e onde se encontram os quatro mananciais que abastecem parte da cidade de Belo Horizonte: ribeirões Mutuca, Fechos, Catarina e Barreiro, - já mencionados no primeiro capítulo dessa monografia. Esses mananciais juntos são responsáveis pelo abastecimento de 320.000 pessoas, 9% da população de Belo Horizonte e 7% da região metropolitana. Essa área, como já citado anteriormente, encontra-se protegida por uma Lei Estadual que dispõe sobre a proteção de seus recursos hídricos, além de outras leis e decretos que serão mencionados mais a diante. Todavia, esses dispositivos legais não representaram nenhum tipo de empecilho para a obtenção das licenças necessárias para o funcionamento da mineração de Capão Xavier. Sob argumentação de o empreendimento estar em consonância com os “interesses públicos” e as medidas compensatórias previstas pelas condicionantes se enquadrarem no modelo que segue os princípios do desenvolvimento sustentável, a empresa completou seu processo de licenciamento dentro dos parâmetros legais junto ao órgão fiscalizador de meio ambiente do estado e outros órgãos institucionalizados. Das leis e decretos descumpridos no processo de licenciamento da MBR estão:

·        Contrárias ao licenciamento do empreendimento:

Lei Estadual nº. 10.793/1992, que, dispondo “sobre a proteção de mananciais destinados ao abastecimento público”, veda “a instalação, nas bacias de mananciais”, de “atividade extrativa vegetal ou mineral” e outras consideradas poluentes.

Lei Federal nº. 9.433/97, que “institui a política nacional de recursos hídricos”, é, no entanto, bem clara: “a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada” e, além do Poder Público e das comunidades, deve “contar com a participação (...) dos usuários”.

Decreto Estadual nº. 21.372/81, que “define como de interesse especial, para proteção de mananciais, terrenos situados na bacia hidrográfica do Córrego Mutuca”, ficando “declaradas de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação natural” ali existentes.  

·        Contrárias aos impactos previstos no EIA–RIMA:

Lei nº. 5197 Federal - código florestal e Lei Federal nº. 7653/67 - proteção à fauna, leis específicas de proteção da flora e fauna, em especial no que se refere a espécies endêmicas e/ou ameaçadas de extinção.

Lei Federal nº. 99274, art. 27, que dispõem sobre atividades que causem danos diretos ou indiretos às unidades de conservação.

Lei Federal nº. 9985, que trata de desafetação dos limites de unidades de conservação.

Lei Federal nº. 9605, art. 38, que dispõem sobre crustáceos considerados como pesca. E o código da pesca, título 5, que trata dos invertebrados aquáticos.

Decreto Lei Federal nº. 9956/90, art. 2o e 3o, legislação que protege as cavidades naturais.

 

Foto 3: Localização da Mina de Capão Xavier e da captação dos ribeirões de Mutuca e Barreiro.

   Foto: Arquivo Movimento Capão Xavier Vivo.

 

 

 

 

Em decorrência das condicionantes propostas no momento de obtenção das licenças, algumas medidas mitigadoras para minimizar os impactos causados pelo empreendimento foram apresentadas pela MBR via um plano de compensação ambiental. Das propostas apresentadas, merecem destaque o comprometimento da empresa com a doação de áreas rurais, totalizando 1.018 hectares de terras para o Parque Estadual Serra do Rola Moça; A criação de um lago no local da cava, onde (segundo informações da empresa na ocasião da visita de campo), com o fim das escavações a água dos mananciais voltará a atingir o nível original do período anterior a implementação da mineração e permitirá que os fluxos subterrâneos voltem a correr normalmente; O preenchimento da cava da Mutuca[20] com o rejeito e o estéril, de forma a restabelecer a topografia do local.

Diante de tal cenário, o Movimento Capão Xavier Vivo, que vem atuando desde 2003 a favor da preservação do meio ambiente e dos mananciais de abastecimento público de Belo Horizonte, vem denunciando as ações adotadas pela MBR, COPASA, FEAM, COPAM e Prefeitura de Belo Horizonte e, questionando o processo de licenciamento de Capão Xavier, assim como os projetos de medidas compensatórias previstos nas condicionantes e os rumos atuais do empreendimento. Através do site na internet[21], idealizado pelo movimento, pode-se acompanhar o histórico do caso por meio da publicação de artigos, matérias divulgadas sobre Capão Xavier pela imprensa, relatos de audiências, estratégias adotadas pelos integrantes da causa e ações jurídicas encaminhadas ao Ministério Público.

Essas medidas adotadas pelo movimento[22], mais que advertirem sobre os meios viciosos do licenciamento ambiental atual, ainda chamam a atenção para o histórico de desrespeito e prejuízos ao meio ambiente realizados pela MBR ao longo de suas atividades no estado. A MBR é responsável pelo desabamento de parte da Serra do Curral, onde também deixou uma cratera enorme (Fotos 4 e 5), e, desconstituição da paisagem do Pico do Itabirito – localizado no município de Itabirito (Foto 6), ambos considerados Patrimônio Histórico Natural. Suas explorações ainda são apontadas como responsáveis pelo desaparecimento de nascentes do Clube Campestre (RMBH), prejuízo de mananciais do município de Itabirito, além de estragos ambientais em “Tejuco”, no município de Brumadinho.

 

Foto 4: Cava da extinta Mina de Águas Claras

         Foto da autora, 22/10/2008

Foto 5: Vista panorâmica da Mina de Águas Claras.

                           Foto: Arquivo Movimento Capão Xavier Vivo

 

 

 

 

 

Foto 6: Vista panorâmica do Pico do Itabirito

               Foto: Arquivo movimento Capão Xavier Vivo

 

 

Em visitas de campo realizadas no local nos dias 18/10/2008 - nos arredores do bairro Jardim Canadá e no Parque Estadual Serra do Rola Moça - e em 22/10/2008 – nos aposentos da sede da Vale em Águas Claras e na área da mineração de Capão Xavier – evidências da importância ambiental da área (Fotos 7 e 8), principalmente no que diz respeito as suas riquezas em recursos hídricos, puderam ser constatadas pelas placas encontradas no Parque (Fotos 9 e 10). Na visita a sede da Vale, vídeos explicativos sobre as etapas do processo de mineração e sobre a política ambiental adotada pela empresa foram apresentadas aos visitantes, além de uma palestra com instrutoras e duas engenheiras ambientais. Nas falas dessas últimas, tanto quanto nos vídeos, chama atenção o fato de frisarem com bastante intensidade a preocupação da empresa em manter um bom relacionamento com as comunidades vizinhas aos empreendimentos e também, sobre a constante preocupação ambiental vinculada aos projetos de mineração.

 

 

Foto 7: Vista parcial da Serra do Rola Moça.

                              Foto da autora: 18/10/2008.

 

 

 

 

 

Foto 8: Placa explicativa sobre o solo da Serra do Rola Moça

                                      Foto da autora: 18/10/2008.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Foto 9: Placa explicativa sobre os mananciais de água da região.

                                      Foto da autora: 18/10/2008.

 

 

 

 

 

Foto 10: Placa explicativa sobre os mananciais de água da região.

                                      Foto da autora: 18/10/2008.

 

 

 

O bairro Jardim Canadá, onde se localiza a cava de exploração de Capão Xavier, faz parte do município de Nova Lima, porém está localizado na rodovia BR-040, entre os municípios de Nova Lima e Belo Horizonte. Como a ocupação desse bairro é relativamente recente, a área ainda carece de muitas melhorias em infra-estrutura básica. A maioria de sua população está associada ao “circuito inferior da economia urbana” (CRAVEIRO: 2006, p. 437), trabalhadores com escassas condições financeiras e de moradia. Desta forma, embora desde o início de suas atividades a MBR (Vale), venha cumprindo com algumas das medidas compensatórias previstas nas condicionantes do licenciamento, tendo celebrado acordo com um grupo de moradores do Bairro Jardim Canadá e com a Associação Comunitária São Judas Tadeu - também do bairro – e também, realizando benfeitorias de infra-estrutura no local, ainda assim muitos moradores reclamam das explosões constantes e poeira gerada pelos caminhões[23].

Além disso, prevê-se que no futuro, no local da cava, se forme um lago de profundidade de 140 mts, um caso nunca antes visto em águas tropicais. Segundo pesquisas elaboradas pelo do Movimento Capão Xavier Vivo, um lago como esse pode resultar na proliferação de gases de odor repugnante e, ainda, a eutrofização - água com super-alimentação de nutrientes - da água, tornando-a pútrida e infecta, praticamente sem possibilidade de tratamento químico, o que afetaria a classificação das águas, rebaixando sua qualidade para “classe 2”, ou seja, uma água de menor qualidade em relação a que hoje pode ser encontrada no local, necessitando de tratamento mais rigoroso para se enquadrar nos padrões de uso domestico.  A atividade minerária de Capão Xavier também contribuirá para a extinção de um microcrustáceo chamado branquiópolo com 500 milhões de anos de existência e também, pode afetar de maneira definitiva, cavernas e sítios arqueológicos brasileiros reconhecidos pelo IPHAN e, inclusive, citados nos estudos do EIA-RIMA. Tais conseqüências já são objetos de ação judicial e, uma vez que se enquadram em um projeto depredador do meio ambiente e também foram alvo de denúncia à ONU pelo Relator para os Direitos Humanos (junto à ONU), Jean Pierre Leroy em 2005[24].

Para completar o histórico do caso, cabe ainda citar os impactos previstos para o os mananciais, o principal recurso natural reivindicado pelo Movimento Capão Xavier Vivo. Segundo estudos elaborados pela Frasa Ingenieros Consultores S.L., empresa contratada para avaliação da complexidade hidrogeológica do local e elaboradora do EIA-RIMA para a MBR, a mineração naquele local fará com que as águas do córrego de Fechos tenham sua vazão natural reduzida substancialmente, em 40% e os córregos de Catarina e Barreiro tenham redução significativa, em torno de 20%, além de impactos irreversíveis em sua zona de proteção. Em outro estudo, elaborado pelos engenheiros Hélio Lazarim e Celso Loureiro[25], “os resultados obtidos com a simulação deste cenário indicaram o desaparecimento definitivo do Córrego Seco e diminuições de mais de 38% das vazões ao longo do Córrego dos Fechos, no final da operação da mina”. E ainda, “na região do platô topográfico do Bairro Jardim Canadá, o rebaixamento previsto para o nível do lençol d’água seria da ordem de 50 a 70 metros, o que resultaria na desativação da maioria das cisternas e poços tubulares de águas subterrâneas atualmente em operação no bairro”. Tais impactos apenas podem ser revertidos, de maneira integral ou parcial, caso se “(...) estabeleça efetivamente, um programa de aproveitamento integrado dos recursos hídricos locais, garantindo a disponibilidade das águas removidas na mina e promovendo o abastecimento complementar das entidades potencialmente prejudicadas assim como a eventual redistribuirão das parcelas retiradas de água, de volta para as coleções naturais afetadas” (LOUREIRO e LAZZARINI: s/ data, b).

As soluções técnicas oferecidas pela MBR para a reconstituição da local, como previsto no plano de compensação ambiental, continuam desrespeitando as leis e decretos estabelecidos para proteger a área, subordinando o meio ambiente a interesses estranhos, pouco comprometidos com sua manutenção de maneira equilibrada ou, a preservação desse patrimônio natural para as gerações futuras. Nessa lógica, o conflito ambiental aqui presente também pode ser classificado como uma questão de ética, afinal o que está em jogo: os direitos difusos de proteção ao meio ambiente e garantia de qualidade de vida aos cidadãos ou os interesses privados de desenvolvimento econômico e geração de renda? Abastecimento de água para a sociedade seguindo uma lógica distributiva e pautada na equidade ou exploração de minério para elevar os índices de exportação do país, seguindo uma lógica de acumulação meramente mercantil?

Para CHESNAIS e SEFATI, a transformação capitalista da natureza “(...) cria para os proprietários desse capital um novo campo de acumulação de riqueza que se alimenta da destruição acelerada dos recursos naturais e, no caso dos "direitos de poluir", de danos sem dúvida irreversíveis à biosfera” (2003a). Assim, a dominação de determinados lugares, sem se preocupar com as destruições ambientais e ecológicas e as agressões contra a vida que possam ocasionar, nada mais é que o reflexo da demanda do capital por novos mercados de ações. Nesse cenário são impostas “estratégias de dominação econômica e política sem precedentes em sua forma e seus objetivos, acompanhadas por ‘apostas’ tecnológicas cegas, de uma irresponsabilidade social total” (como observado na construção do lago no local da cava), além da transferência do “(...) peso das degradações para países e para classes mais fracas” (tais quais os moradores do bairro Jardim Canadá, que não possuem os meios necessários para combaterem a exploração mineral no local). (CHESNAIS e SEFATI: 2003b).

Assim sendo, o capítulo que se segue tratará das estratégias e motivações que movem de um lado a MBR e do outro o Movimento Capão Xavier Vivo, como maneiras a legitimarem suas posições neste campo assimétrico de apropriação do espaço.

 

 

 

 

Cap.3 - Estratégias e articulações dos sujeitos em disputa

 

            Com o Estado cada vez mais conduzido pela lógica desenvolvimentista global, as políticas econômicas passaram a assumir um papel de destaque muito maior que o das políticas sociais e, com isso, os cidadãos que deveriam ser protegidos pelo Estado se vêem desamparados. Entretanto, viemos assistindo a atuação fundamental dos movimentos sociais como novas formas de ativismo e militância política capaz de reivindicar pelos verdadeiros direitos a cidadania, que para além dos direitos econômicos, se estendem também aos direitos sociais, culturais, políticos, étnicos, ambientais, entre outros. Assim, a seguir serão acompanhadas as muitas estratégicas e articulações elaboradas pelo Movimento Capão Xavier Vivo, responsáveis pela projeção do Movimento em outras esferas, se aderindo a novas lutas e questionamentos. Em seguida, serão apresentadas as estratégias da MBR para combater as críticas e denúncias a respeito de seus empreendimentos. E na sessão de encerramento do capítulo, será feita uma reflexão acerca da importância dos movimentos sociais na participação política do Estado Nacional.

 

 

3.1  - Estratégias e articulações em defesa das águas de abastecimento público

 

Foi a partir de 1998 que se deu as primeiras mobilizações da MBR para exploração de Capão Xavier através da solicitação de Licença Prévia (LP) junto a FEAM. Daí em diante, a mineradora por meio de convênios, acordos e documentos firmados com a FEAM e COPAM, COPASA e Prefeitura de Belo Horizonte, obteve uma rapidez considerável na votação de seu licenciamento.  Foi assim que em 2003, alguns membros da sociedade civil, dentre eles o jornalista Gustavo Tostes Gazzinelli, a advogada e professora de Direito Delze dos Santos Laureano, o frei e padre Carmelita e assessor da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Via Campesina, entre outras entidades, Gilvander Luis Moreira, o engenheiro civil Ricardo Carvalho Santiago e o advogado Otávio Gonçalves Freitas, se engajaram na causa de Capão Xavier. Coincidentemente no ano seguinte, 2004, o tema da Campanha da Fraternidade foi o da “Água, fonte de vida”. Naquele ano, a Igreja do Carmo (onde atua o Frei Gilvander Freitas) assumiu duas ações concretas: a) Lutar pela preservação dos Mananciais de abastecimento Público de Capão Xavier; b) Ajudar financeiramente o Projeto Hum milhão de cisternas no semi-árido brasileiro. Assim, os cidadãos acima citados e ainda com a participação de algumas entidades convidadas, como: a CUT; SINFRAJUPE; ONGs ambientais; Colégio Arnaldo; e outros cidadãos da sociedade civil simpatizantes da causa, teve inicio o Movimento Capão Xavier Vivo.

Atualmente, o Movimento, através da congregação de toda essa rede de participantes, atua na luta pela preservação do meio ambiente e dos mananciais de abastecimento público da Região Metropolitana de Belo Horizonte, se fundamentando em ações judiciais apresentadas nas esferas estadual e federal; articulações com outros parceiros; publicação de artigos; estudos; ações em protesto público; material fotográfico e notas a imprensa sobre o caso. A respeito da importância da organização em rede, como a observada no caso de Capão Xavier, discute Ilse Scherer-Warren:

 

As redes, por serem multiformes, aproximam atores sociais diversificados — dos níveis locais aos mais globais, de diferentes tipos de organizações —, e possibilitam o diálogo da diversidade de interesses e valores. Ainda que esse diálogo não seja isento de conflitos, o encontro e o confronto das reivindicações e lutas referentes a diversos aspectos da cidadania vêm permitindo aos movimentos sociais passarem da defesa de um sujeito identitário único à defesa de um sujeito plural. (2006a).

 

Ações Judiciais nas esferas Estadual e Federal:

Utilizando-se do linguajar técnico reconhecido e legitimado pos aqueles que fazem parte do campo ambiental[26], o Movimento Capão Xavier Vivo vem elaborando seus contra-laudos, em busca da defesa dos mananciais e do direito de abastecimento de águas dos cidadãos da RMBH, procurando contestar os laudos encaminhados pela MBR aos órgãos ambientais, que concederam a empresa o direito em explorar a área onde está localizada a mina. Essa linguagem técnica, embora se apresente demasiado cientificista a por vezes afastada do discurso social, se constitui como estratégia importante para estabelecer um diálogo, o mais simétrico possível, no contexto político dos embates ambientais.

Em agosto de 2003, Ricardo Carvalho Santiago, Gustavo Gazzinelli e Otávio Freitas apresentaram a primeira representação ao Ministério Público do estado de Minas Gerais sobre a licença prévia da mina de Capão Xavier, concedida pelo COPAM, mas que ainda não havia saído, e, em setembro de 2003 os mesmos cidadãos apresentaram uma representação ao Ministério Público Federal abordando a mesma questão. Contudo, sem obter respostas das representações, no dia 17 de dezembro de 2003, os três ajuízam uma ação popular, com pedido de liminar, contra o processo de licenciamento para implantação da mina de Capão Xavier. Porém, a MBR conseguiu suspensão da liminar e deu continuidade à construção de uma estrada ligando a mina de Capão Xavier a Mutuca.

Em 10 de novembro de 2003 então, é proposta uma Ação Popular na Justiça Estadual, como medida preventiva, no sentido de evitar futuros danos que pudessem ser causados pela mineração. Dos fatos que fundamentavam o pedido, entre outras críticas aos impactos da mineração para os Ribeirões de Fecho, Mutuca, Barreiro e Catarina, estava a insuficiência dos estudos do EIA-RIMA apresentado pela MBR.

Em janeiro de 2004, por sua vez, a advogada Delze dos Santos, entra com recurso pedindo a retração da decisão do desembargador Caetano Levi, que acatou o pedido da MBR de suspender a liminar. E, em 02 de março de 2004, o Ministério Público recomenda ao COPAM que não conceda licença para a exploração da Mina de Capão Xavier, sob alegação de as informações dos estudos elaborados pela Frasa Ingenieros – empresa contratada pela MBR para realizar os estudos hidrogeológicos – não estavam esclarecendo substancialmente as possíveis conseqüências da operação de drenagem para a lavra da Mina. Ainda em 24 de março do mesmo ano, os deputados Estaduais Adaclever Ribeiro Lopes e Antônio Júlio de Faria entram com uma Ação Popular e uma Ação Ambiental na Justiça Federal. Em um dos trechos desta última, no que diz respeito aos fatos e fundamentos jurídicos, lê-se:

 

(..) o EIA-RIMA do Projeto Capão Xavier / MBR, que tem sua área de influência os mananciais do Mutuca, Fechos, Catarina e Barreiro, no capítulo referente à Legislação Ambiental, omitiu a citação da referida Lei 10.793/92[27] . (...) Além disso os mapas do EIA-RIMA projetam um trecho da Mina de Capão Xavier sobre um trecho inscrito na área de interesse especial para proteção do manancial do Mutuca (Decreto Estadual 21.372/81), o que caracteriza a ilegalidade do empreendimento que o COPAM está licenciando (Ação Ambiental de 24/03/2004).

 

No dia 28 de maio de 2004, o Ministério Público entrou com uma Ação Pública contra a MBR, FEAM, COPAM, IEF e Prefeitura de Belo Horizonte. Dos fatos presentes na Ação destaca-se:

 

É de conhecimento público e notório neste Estado de Minas Gerais a repercussão que vem causando a possibilidade do início da operação (...) ‘Mina de Capão Xavier’(...). Tal repercussão decorre das incertezas e da insegurança quanto aos impactos ambientais que a operação do empreendimento poderá causar aos recursos hídricos (em especial ao abastecimento público das águas) pela pretensão de rebaixar o nível piezométrico (do lençol freático) / (Ação Civil pública / Maio:2004).

 

Cabe destacar também os argumentos 14 e 15 presentes na síntese conclusiva da Ação:

14- O parecer técnico que fundamenta a concessão da licença de operação do empreendimento menciona a necessidade de licenciamento futuro para o rebaixamento do nível piezométrico, mas o empreendimento foi concebido de forma englobar a atividade de exploração mineral com o rebaixamento do nível piezométrico. Não se trata de nova fonte, mas de empreendimento único que já previa a atividade de rebaixamento. Não há amparo jurídico para o fracionamento do procedimento de licenciamento ambiental.

 

15- No certificado de Licença Ambiental de Operação nº. 238, de 25 de março de 2004, (...), não consta qualquer restrição para que o empreendimento promova o rebaixamento do nível piezométrico. Também não há qualquer condicionante que estabeleça medidas concretas para garantia da qualidade das águas (...). Não houve a preocupação em garantir-se o abastecimento público de água potável no período de inundação da cava (15 anos) / (Ação Civil pública / Maio: 2004).

 

Como conseqüência das várias denúncias apresentadas nas Ações e Representações encaminhadas ao MP Estadual e Federal, no dia 10 de março de 2004, 27 deputados subscreveram um requerimento dos deputados Adalclever Ribeiro Lopes e Antônio Júlio de Faria pedindo a instalação de uma CPI na Assembléia Legislativa de Minas Gerais. A CPI aprovada para apurar as (i)regularidades dos processos de licenciamento prévio (LP), de instalação (LI) e de Operação (LO), das atividades da MBR no Estado de Minas Gerais, bem como do julgamento dos recursos dos autos de infração atribuídos à MBR. Além disso, os deputados queriam também analisar o papel da COPASA no caso.

Depois de instaurada a CPI, várias reuniões foram realizadas ao longo do ano de 2004 na assembléia legislativa, nas quais foram ouvidos representantes da MBR, da COPASA, da FEAM, do Movimento Capão Xavier Vivo, entre outros. Numa dessas reuniões, do dia 26 de abril, a comissão ouviu o promotor Fernando Galvão, da Curadoria de Proteção ao Meio Ambiente – um dos autores da ação popular contra a exploração. Em sua fala, Galvão apontou falhas e omissões no parecer da FEAM e no EIA que permitiram o licenciamento de operação da mina, como por exemplo, a falta de um plano de gestão hídrica que demonstre a garantia de abastecimento de água para moradores de Nova Lima e esclarecimentos sobre a água classificada como "especial", que irá passar para "classe dois", implicando no decréscimo de sua pureza.

Apesar das várias irregularidades apontadas sobre o licenciamento da mina de Capão Xavier ao longo das reuniões da CPI, o relatório final da mesma foi aprovado por quatro votos a dois, descartando irregularidades no processo de licenciamento feito pela FEAM. Tal resultado motivou o Movimento Capão Xavier Vivo a fazer um pronunciamento à imprensa e a sociedade[28] em desacordo com o veredicto final, no qual afirmaram que:

 

O relatório final não traduz as graves ilegalidades e os diversos riscos que foram apresentados. A escolha pelo texto foi estritamente política. (...) Por tudo isso, repudiamos o relatório final apresentado pelo Deputado Domingos Sávio. O que esperávamos da CPI da MBR era o reconhecimento de que o licenciamento da Mina de Capão Xavier foi irregular e viciado, e por isso que fosse exigida a imediata paralisação das atividades dessa Mina ilegal e imoral (Nota à imprensa e à sociedade: 2005).

 

 

Ações públicas e publicidade do caso:

            Naquele mesmo ano de 2004, a Campanha da Fraternidade adotou o lema “Água, fonte de vida”, de maneira a atentar sociedade sobre a importância da água como um elemento essencial para a sobrevivência e o direito de todos a esse recurso natural, assim como a importância em preservá-lo. Inspirados pelo tema da Campanha a Fraternidade e dando continuidade às ações contrárias à operação da mineração de Capão Xavier pela MBR, o ano de 2004 foi marcado pelo esforço dos integrantes do Movimento em elaborar artigos, abaixo-assinados, caminhadas, entre outras ações que fortalecessem a causa[29].

            Entre essas ações destaca-se a criação do “Grito de Guerra”, lema do Movimento:

 

 O projeto (da MBR) é ilegal, porque fere as leis ambientais; é imoral porque rompe com uma história de mais de cem anos de preservação daqueles mananciais de abastecimento público e porque desmoraliza as instituições públicas que foram coniventes ou omissas; é prepotente quando desafia a vontade divina e se arvora em multiplicador de águas; é irresponsável, quando submete a população de toda a cidade aos riscos de um holocausto ambiental. Enfim, desrespeita o direito à vida das próximas gerações e fere o direito da flora e da fauna ali existentes[30].

 

Foi também elaborado um dossiê sobre a Mina de Capão Xavier, onde o Movimento reuniu artigos, notas da imprensa, representações encaminhadas ao Ministério Público, entre outros, em 200 páginas intituladas “O Imbróglio de uma Farsa”, denunciando o Projeto da Mina de Capão Xavier. Assim como foi divulgada a Lista Suja[31] 2004 do Movimento Capão Xavier Vivo[32]:

 

·        AMDA - Associação Mineira de Defesa do Ambiente
- É financiada por empresas poluidoras;
- Defende o consumo e não o meio ambiente;
- Não representa a sociedade civil organizada.

 

·        COPAM - Conselho Estadual de Política Ambiental
- Autorizou a operação da Mina Capão Xavier, contrariando as Leis Ambientais e o Ministério Público.

 

·        FEAM - Fundação Estadual do Meio Ambiente
- Foi favorável ao Projeto ILEGAL da Mina de Capão Xavier.

 

·        COPASA – Companhia de Saneamento de Minas Gerais
- Água de graça para a MBR e muito cara para a população;
- Subserviente aos interesses da MBR;
- Expõe nossos Mananciais de Abastecimento Público aos riscos da mineração e à ganância da MBR.

 

·        MBR – Minerações Brasileiras Reunidas
- Comeu grande parte do nosso Patrimônio Histórico Natural, que é a Serra do Curral e o Pico do Itabirito;
- Deixou uma enorme cratera em Águas Claras;
- Expõe à extinção Mananciais de Abastecimento Público;
- Exporta o minério de ferro a preço irrisório, deixando o Meio Ambiente arrasado.

 

Merece destaque também a Caminhada em defesa das Águas de Capão Xavier  realizada no dia 03 de abril de 2004 (Fotos 8 e 9):

 

Foram 10 Kms de caminhada e 05 Kms de carreata, das 8:00 hs às 13:30 hs, da Igreja do Carmo até Jardim Canadá, na BR-040 (Nova Lima), onde a MBR pleiteia explorar a Mina de Capão Xavier. (...)Vestidas de branco, trajando camisetas com inscrições, tais como: “Preservar a água é preservar a vida!” ou “Água é fonte de vida!”, cerca de 1.000 pessoas botaram o pé na estrada, rumo a Capão Xavier, carregando no coração a convicção de que defender os Mananciais de Abastecimento é um imperativo ético para o desenvolvimento sustentável. (...) na entrada da estrada que dá acesso à pretensa mina de Capão Xavier aguardavam-nos 06 (seis) viaturas da Polícia: 03 (três) da polícia militar de Minas Gerais e 03 (três) viaturas da guarda municipal de Nova Lima. No total uns 15 policiais perfilavam-se na entrada do empreendimento para impedir que os manifestantes entrassem no local. Eram servidores públicos, pagos com dinheiro do contribuinte, servindo, sendo usados, para proteger patrimônio privado[33].

 

 

Foto 8: Participantes da caminhada com faixas de protesto.

                                    Foto: Arquivo Movimento Capão Xavier Vivo.

 

 

 

Foto 9: Grande número de participantes na caminhada até a Mina de Capão Xavier.

                                    Foto: Arquivo Movimento Capão Xavier Vivo.

 

 

A respeito dos direitos humanos desrespeitados no caso de Capão Xavier, destaca-se a publicação da Plataforma DHESC, “Projeto dos Relatores Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais”, um Programa dos Voluntários das Nações Unidas (UNV-PNUD), no qual o Relator Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente, Jean Pierre Leroy, depois de ter realizado missões de apuração de violações ao meio ambiente e direitos humanos em várias partes do país e após ter ouvido as denúncias de atingidos por monoculturas de eucalipto, minerações e hidrelétricas, numa audiência na assembléia legislativa de Minas Gerais, em agosto de 2005, criticou os casos de violações ao direito humano e ao meio ambiente no Brasil, praticadas por atores da coalizão dominante e que não são assistidas pelo Estado.

 Em 2005 ainda, a CPT denunciou as autoridades a ocorrência de “situações suspeitas” de intimidação contra frei Gilvander, membro do Movimento Capão Xavier Vivo, destacado por grande empenho de atuação no caso.  Numa dessas situações, Gilvander foi procurado por um homem que estava armado, muito nervoso e falava em tom agressivo, estava acompanhado por outro que permaneceu na moto (ligada), na portaria da Igreja do Carmo em Belo Horizonte.

Mais adiante em março de 2007, cerca de 600 mulheres em encontro da Via Campesina, entre elas, sem terra, atingidas por barragens, quilombolas, geraizeiras, indígenas, camponesas, agentes de pastorais e estudantes, interromperam as atividades da MBR na mina de Capão Xavier, impedindo a pista de saída e entrada dos caminhões de minério de ferro.

Atualmente o Movimento Capão Xavier Vivo prossegue suas atividades através de notas divulgadas à imprensa, publicação de novos artigos em seu site e elaboração de novas representações a serem encaminhadas ao Ministério Público. Enfatizando que sua luta continua em defesa das águas de abastecimento público, estão associados a outras lutas como por exemplo, a contrária à transposição do Rio São Francisco. Esse fato diz muito a respeito do caráter associativista do Movimento na sua atuação em rede com outras entidades e movimentos de “lutas irmãs”, fazendo dessas associações mais uma estratégia de articulação para troca de experiências vivenciadas e empoderamento das lutas.

 

 

3.2  - Estratégias e articulações a favor da exploração do minério

 

Em contrapartida as estratégias adotadas em defesa das águas, a MBR também se articula em defesa de seus interesses adotando estratégias e firmando convênios, acordos e documentos que a possibilitem prosseguir com as atividades na Mina de Capão Xavier.

Na época em que a mineradora ainda aguardava o processo de licenciamento encaminhado à FEAM, algumas estratégias foram tomadas. Em setembro de 2002, a MBR firmou acordos com os moradores do bairro Jardim Canadá, vizinhos da mina e organizados em associações de bairro, como estratégia de angariar a simpatia da classe mais baixa (que compõe a grande maioria de moradores do bairro) em detrimento de outros atores articulados (como as empresas instaladas nas redondezas que tem como grande parte do seu quadro de funcionários moradores de Belo Horizonte que apenas passam o dia no local, voltando as suas casas com o fim da jornada de trabalho). Entre os acordos, estavam as promessas de construção de um campo de futebol, um posto de saúde, uma creche e asfaltamento de ruas[34]. Já em março de 2003, a empresa consegue junto a Prefeitura de BH a celebração de um termo de compromisso que a autoriza a construir a mina num local que faz divisa com terrenos públicos (já que Capão Xavier está em terreno novalimense, mas a estrada para escoamento fica em território da capital mineira). Em troca, a empresa se compromete com a doação de uma área de mata para o Parque Estadual Serra do Rola Moça, um seguro ambiental e monitoramento permanente da flora e mananciais, com a participação do Executivo Municipal.

Junto a COPASA, por sua vez, foi celebrado um acordo no qual a Companhia transferiria à mineradora a responsabilidade pela reposição dos déficits que acontecerão com respeito ao abastecimento de água e a responsabilidade pelo monitoramento de mananciais na região.

Com relação aos estudos apresentados no EIA-RIMA do projeto de Capão Xavier, a MBR ainda oferece, algumas soluções para a área (já mencionadas na última sessão do segundo capítulo desta monografia como forma de diminuir os impactos causados pela mineração ao final de suas atividades. Contudo, no EIA-RIMA foram omitidas pela mineradora algumas leis, dentre elas a Lei 10.793/92 – que veda a instalação de empreendimentos em áreas de mananciais de abastecimento público – e elementos ambientais como as cavernas e espécies únicas da fauna presentes na área, que serão impactadas pelas atividades da empresa.

            Nos inquéritos da CPI de 2004 instaurada para apuração das (i)rregularidades  no licenciamento de Capão Xavier, as estratégias adotadas pela MBR para obter sucesso na  aprovação do empreendimento, podem ser analisadas através da leitura das notas taquigráficas das reuniões reunidas no site do Movimento Capão Xavier Vivo. Tais estratégias comprovam o esquema vicioso no qual se enquadram os pedidos de licenciamento no órgão ambiental do Estado. Sempre apoiados pelo argumento técnico, os representantes da FEAM, IGAM e outros, encontram os meios para justificarem a liberação de licenças. No contexto da CPI, portanto, dentro os muitos depoimentos acompanhados, destaca-se o depoimento da diretora de Instrumentalização e Controle do Instituto de Gestão das Águas (IGAM), Célia Maria Fróes, no qual ela responde a questionamentos dos deputados sobre como se dá o processo de outorga, tramitação e corpo técnico do IGAM. Em sua resposta, dentre outras especificidades, Fróes enfatizou que o órgão era composto por técnicos de engenharia civil, hidrologia, geologia e mais seis fiscais, também com formação universitária nessas áreas e que as concessões são feitas em pareceres conjuntos com a FEAM. Célia Fróes ainda afirmou que o IGAM não usa a legislação de meio ambiente para amparar seus pareceres, mas garantiu que o processo da MBR seguiu a tramitação normal e a outorga foi dada com base em um estudo com 240 páginas fornecido pela empresa e após visita dos técnicos do IGAM ao local. Segundo esse critério adotado pelo IGAM, a MBR, portanto, não precisaria encaminhar um novo pedido de licenciamento para o rebaixamento do lençol freático, bastando apenas a concessão de uma outorga pelo órgão ambiental.

            Em visita de campo realizada na sede da Vale e na mina de Capão Xavier, também pude acompanhar alguns artifícios adotados pela empresa para fundamentar a “responsabilidade ambiental” de suas atividades. Os funcionários instruídos para acompanhar o programa de visita da empresa enfatizam aos visitantes a respeito da importância do uso da tecnologia integrada ao meio ambiente para atingir o melhor desempenho possível de desenvolvimento sustentável, sem que com isso interfiram de maneira desapropriada nas dinâmicas das culturas locais. Essas afirmações podem ser facilmente desqualificadas diante dos inúmeros casos de conflito ambiental entre a Vale e outros grupos sociais no estado de Minas Gerais. Dentre esses casos destacam-se a abertura estradas e desmatamento sem autorização dos órgãos competentes para pesquisas minerais em áreas particulares, retirada de famílias de suas terras para construção de barragens, entre outros. Em junho de 2008, integrantes da Via Campesina e de outros movimentos sociais realizam manifestações em pelo menos quatro estados brasileiros. E Minas Gerais, a manifestação foi marcada pela ocupação de uma ferrovia da Vale, em Governador Valadares, por cerca de 1.500 pessoas da Via Campesina e da Assembléia Popular. Os manifestantes reivindicavam que a empresa iniciasse as negociações com 500 famílias que iriam ser desalojadas pela Barragem de Baguari, construída pela Vale entre os municípios de Governador Valadares e Periquito.

A respeito da gestão das águas, os representantes da empresa durante a visita de campo, afirmaram que as águas são monitoradas constantemente, e que em casos de diminuição da vazão, serão realizados novos estudos que indiquem as causas dessa diminuição, pois, segundo os técnicos a redução da vazão pode estar muito mais relacionada há “fatores naturais”, como o regime de chuvas, do que as atividades extrativas da empresa. E sobre a cava, confirmaram que o projeto licenciado permitirá sua perfuração até o ano de 2014, contudo, essa cava pode ter uma profundidade ainda maior, dependendo de estudos que possam vir a ser elaborados.

As ações e estratégias adotadas pela MBR, aqui expostas, demonstram claramente como percepções antagônicas sobre um mesmo espaço podem ser incorporadas por sujeitos sociais a partir do referencial em que se encontram. A concepção de responsabilidade ambiental tomada pela MBR (assim como acontece com outras empresas ao redor do globo), nada mais é que o enquadramento da natureza na lógica do desenvolvimento sustentável através da aplicação de mecanismos técnicos para “solucionar” as degradações causadas pelos projetos industriais. Essa perspectiva, mais conhecida como “Modernização Ecológica”, permite a adoção de “instrumentos de gestão” que garantem o status de “boa conduta ambiental” das empresas, retirando de seu caminho os obstáculos que dificultam os processos de licenciamento:

 

Desta maneira, os “impactos” da espacialização do processo de acumulação de capital sobre os territórios, suas condições naturais e populações são percebidos como solucionáveis por meio da utilização de novas tecnologias e de um planejamento racional. O que subjaz a essa visão é a concepção do meio ambiente como uma realidade objetiva, instância separada e externa às dinâmicas sociais e políticas da sociedade (ZHOURI e ZUCARELLI: 2008c, p.20).

 

 

            Contudo, em virtude das identidades múltiplas dos lugares, nos deparamos com o surgimento de diferentes conflitos ambientais, que além de apresentarem outras práticas sociais, de uso e de significação do espaço que extrapolam as tentativas de resolução técnica, são também questionadores dos “(...) mecanismos desiguais de distribuição e acesso ao meio ambiente e dos custos, risco e impactos resultantes dessas práticas (...)” evidenciando, “(...) a existência de distintas formas de se conceber e de se interagir com o meio ambiente, levando-nos a reconhecer os múltiplos projetos de sociedade, que acionam diversas matrizes de sustentabilidade e esbarram nas reais assimetrias de poder impressas nas dinâmicas sociais e políticas” (ZHOURI e ZUCARELLI: 2008d, p.21). Esses conflitos ambientais, organizados ou não, trazem a tona as lutas de resistência que irão propor a reafirmação do lugar, baseando-se na cultura local, sua formação histórica e berço de identidades autênticas, em oposição aos domínios do espaço, do capital e da modernidade.

 

 

3.3  - A importância dos movimentos sociais na participação política.

 

O desenvolvimento sustentável como linha direcionadora da globalização, entendida aqui pelos modelos de Modernização e Desenvolvimento difundidos pelas classes dominantes do mudo ocidental, principalmente no que diz respeito aos impactos ambientais, têm valorizado as possibilidades técnicas como maneiras de solucionar as intervenções na natureza. Assim, celebra-se o mercado e esvazia o debate político das agendas governamentais. Esse padrão se apresenta vinculado às oportunidades de lucros possíveis de serem alcançados pelas empresas, pelo Estado e até mesmo para nossos ganhos pessoais. Nessa lógica, um dos efeitos negativos da globalização está na exaltação das questões econômicas e o silenciamento de outros questionamentos como os de ordem filosófica, ética e moral. Até mesmo o Estado vem concentrando mais força nas políticas de ordem econômica ao invés do que deveria ser seus princípios fundamentais: o bem-estar social, o controle ambiental e o interesse democrático dos povos. Por outro lado, a globalização tem ajudado a construir novos padrões de comunicação, facilitando e expandindo a identificação e associação entre grupos e culturas entre si.

Por essa outra via, os espaços de resistência que ocorrem em esferas mais localizadas, reivindicando por direitos humanos, questões ambientais, de gênero, etnia, entre outros, encontram os meios técnicos necessários – como a Internet e as trocas de e-mailspara o estabelecimento de diálogos com outros grupos, se associando em verdadeiras articulações em redes de resistência.  Nesses espaços

 

(...)a temática ambiental, ao lado das questões de gênero, parece ter sido uma das que mais conseguiu penetrar na diversidade das lutas sociais nas últimas décadas e alcançar certa legitimidade em diferentes segmentos sociais, inclusive no âmbito das lutas populares e sindicais, que, de certa forma, foram, em um determinado momento, o contraponto desses novos movimentos (CARVALHO: 2008).

 

O Movimento Capão Xavier Vivo, como descrito anteriormente, se configura como um caso exemplar de integrantes da sociedade civil, organizados em rede em prol de interesses e valores éticos, político, moral e espiritualmente constituídos, para reivindicar por direitos humanos e ambientais em escala local. Através de ações políticas e públicas como protestos sociais, manifestações simbólicas e pressões políticas, o movimento já alcançou algumas conquistas relevantes no campo de forças assimétricas no qual insere sua luta. A esse respeito destaca SCHERER-WARREN:

 

(...) observa-se que as mobilizações na esfera pública são fruto da articulação de atores dos movimentos sociais localizados, das ONGs, dos fóruns e redes de redes, mas buscam transcendê-los por meio de grandes manifestações na praça pública, incluindo a participação de simpatizantes, com a finalidade de produzir visibilidade através da mídia e efeitos simbólicos para os próprios manifestantes (no sentido político-pedagógico) e para a sociedade em geral, como uma forma de pressão política das mais expressivas no espaço público contemporâneo. (2006c)

 

Contudo, esse é apenas um dos casos de indivíduos articulados entre si ou com outros grupos com a mesma identidade social ou política, pela busca do empoderamento da sociedade civil para lutar por seus direitos. Nesse contexto, se reconhecem os movimentos sociais, ONG’s, os fóruns, as redes e os simpatizantes das diversas causas, como os novos  atores políticos contemporâneos, capazes de resgatar os princípios fundamentais de bem-estar social, controle ambiental e interesse democrático dos povos, e produzir impactos relevantes na esfera pública para obter conquistas para a cidadania.

No que diz respeito a articulação do lugar, proposta pelas redes, com outras relações e entendimentos sociais, propiciando a visibilidade de múltiplas lógicas de apropriação do terreno, faz-se importante não considerarmos esses lugares, com suas culturas locais e formas econômicas não capitalistas, enquanto entes “intocados” ou fora da história. Esses lugares e localidades também fazem parte da política de mercantilização de bens e massificação cultural, porém, baseados em seu conhecimento e identidade (locais), contribuem para a produção de diferentes significados de economia, natureza e deles mesmos, dentro da ordem capitalista hegemônica. (ESCOBAR: 2005b).

 Dessa forma, os objetivos das lutas dos movimentos sociais são (re)definidos de acordo com as demandas evidenciadas pelo “(...)rastro de destruição produzido pelas transnacionais, financiadas pelo capital especulativo nacional e internacional que, (...), domina – além da economia – os bens naturais disponíveis e o poder político do Estado-Nação” (MOREIRA e LOUREIRO: 2008). Nesse sentido, resgatam “(...) a dignidade de sujeitos socialmente excluídos, porque sem a desconstrução das discriminações introjetadas pelos dominados socialmente não há luta por direitos;” (SCHERER-WARREN: 2006d).

A questão central da importância que representa a participação dos movimentos sociais na esfera política, está no desafio imposto aos mesmos em “(...) apresentarem estratégias e táticas que redundem na transformação do papel do Estado e em formas de alinhamento e integração regional frente ao esgotamento do modelo neoliberal e às imposições dos grandes globalizadores” (MINAYO: 2008). Na medida em que as lutas se fortalecem, a tendência é a de que alcancem a legitimidade necessária para influir na gestão das políticas públicas. Segundo explica SCHERER-WARREN, através da:

 

(...)convergência entre representantes das redes de movimentos, da esfera estatal e do mercado nos conselhos setoriais e nas conferências de promoção de direitos da cidadania; bem como das possibilidades e efetivo empoderamento e democratização no interior das próprias redes de movimento, na direção do desenvolvimento de sujeitos com relativa autonomia na construção de seus destinos pessoais e coletivos (2006e).

 

A idéia de mudança inserida na possível influência dos movimentos sociais na esfera estatal permite a idealização não só de uma nova forma de sociedade, mas principalmente de novas formas de compreensão do mundo e de suas práticas sociais e culturais. Dessa maneira, restabelece as prioridades de interesses pelos quais deveriam ser pautadas as políticas dos estados-nação, afinal, valores que dizem respeito à abrangência da cidadania a todas as esferas sociais deveriam ser considerados mais importantes que as racionalidades econômicas dominantes do mundo globalizado.

 

 

 

 

Conclusão

 

            O trabalho de pesquisa realizado nessa monografia procurou compreender um caso de conflito ambiental muito comum no contexto atual. O caso de Capão Xavier é apenas mais um dentre os vários casos de conflito entre sujeitos sociais com usos e significados distintos de um ambiente específico. No caso estudado, a disputa em questão coloca, de um lado, a mineradora em defesa de sua atividade industrial de exploração de minério e, do outro, o movimento social, em defesa das águas de abastecimento público da cidade de Belo Horizonte protegidas historicamente. Esses dois recursos naturais não só compartilham um mesmo espaço, mas dependem um do outro para se manterem preservados. Nesse contexto, os órgãos públicos ambientais que deveriam honrar a responsabilidade para a qual foram constituídos, baseados em alternativas técnicas, como a “gestão ambiental” do meio ambiente em questão, tomaram a decisão de que o uso que deveria prevalecer sobre o outro seria o da exploração do minério, reconhecendo nessa atividade seu caráter essencial para atender os interesses desenvolvimentistas do país. Esse aspecto retoma as concepções positivistas e modernizantes estabelecidas desde o século passado, que posicionam o Estado como mediador das políticas econômicas definidas para seus estados membros, mantendo-o como definidor único, reconhecido legalmente, das formas de apropriação dos territórios. Esse cenário permite a eclosão dos conflitos ambientais

 

surgidos do rompimento eventual de acordos (...) emblemáticos das contradições que permeiam os modelos de desenvolvimento no interior do qual respectivamente eclodem. E, ao contrário da visão funcionalista para qual os conflitos são um simples sinal de que algo não vai bem, trazendo benefícios ao sistema e permitindo-lhe uma auto-regulação permanente, há que considerar que na recusa dos atores há também uma positividade. E que essa positividade não é apenas constitutiva de sujeitos, que se definem com freqüência em um movimento de recusa, mas ela tem efeitos também, no caso que nos ocupa sobre o modo como se organizam as relações espaciais e as formas de apropriação do território e seus recursos (Acselrad: 2004e, p.17).

 

            Assim, esse trabalho se dedicou ao      entendimento do uso das águas em contextos urbanos, tal qual os deslocamentos do capital pela política econômica global. Através do jogo de interesses econômicos, definem-se as estratégias de eficiência ecológica para cada região do país, aliando o capital, a burocracia e a ciência a favor de grandes projetos industriais como as minerações, hidrelétricas, plantações de monocultura de eucalipto, cana-de-açúcar, entre outros, estabelecendo um padrão homogeinizador do meio ambiente.

            A aprovação do empreendimento de Capão Xavier, portanto, descumpre com um histórico de proteção de uma área que abriga quatro mananciais de água de importância estratégica e fundamental para os cidadãos da RMBH e ainda, desconsidera os vários casos de desrespeito ao meio ambiente realizados pela MBR no estado de Minas Gerais, afrontando os princípios de bem estar social do estado democrático de Direito e privilegiando a “capitalização da natureza”.

O histórico do caso, assim como as estratégias utilizadas pelos sujeitos em disputa, ajuda na compreensão das lógicas de Modernização Ecologia e de Justiça Ambiental internalizadas por esses sujeitos. A primeira estabelece o “desenvolvimento sustentável” como princípio capaz de reduzir os impactos ambientais, sem que com isso se prejudique a apropriação econômica da natureza. A Justiça Ambiental por sua vez, reconhece que os riscos e danos gerados pela apropriação econômica da natureza culminam no prejuízo das camadas mais vulneráveis da sociedade, favorecendo a ocorrência do que se denomina por “injustiças ambientais”. Contudo, tomando o exemplo do Movimento Capão Xavier Vivo em suas lutas e conquistas já alcançadas, percebe-se que essas vítimas das injustiças ambientais “(...)não se constituem como vítimas passivas do processo e vêm se organizando em variados movimentos, associações e redes. (...) Tais movimentos possuem diversas formas de manifestarem seu desacordo (...), ao mesmo tempo em que se colocam como portadores de outros projetos de vida e interação com o meio ambiente” (ZHOURI, at al: 2005d, p. 18).

Portanto, em sua parte final, essa monografia analisa o papel atual dos movimentos sociais no cenário político como fortes articuladores e defensores dos interesses sociais e ambientais.  Para esses movimentos a reapropriação social da natureza, assim como a reafirmação do lugar, significa o reconhecimento de outros projetos produtivos e sociais alternativos, que não tenham como finalidade única a acumulação de capital abstrata. Assim, trazem de volta ao debate, os componentes éticos e morais que estabelecem a necessidade de instituir outros valores e outras racionalidades, que substituam a concepção hegemônica de apropriação monetária da natureza.

 

 

 

 

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[1] Conflitos Ambientais são “[...] aqueles envolvendo grupos sociais com modos diferenciados de apropriação, uso e significação do território, tendo origem quando pelo menos um dos grupos tem a continuidade das formas sociais de apropriação do meio que desenvolvem ameaçada por impactos indesejáveis – transmitidos pelo solo, água, ar ou sistemas vivos – decorrentes do exercício das práticas de outros grupos” (ACSELRAD: 2004, p.26).

 

[2] Relatório Técnico Parcial do Projeto de Pesquisa Mapa dos Conflitos Ambientais no Estado de Minas Gerais elaborado pelo Gesta – Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais em dezembro de 2007.

 

[3] “Fundada em 1965, a Minerações Brasileiras Reunidas S/A - MBR é a segunda maior produtora e exportadora de minério de ferro do país - e a quarta do mundo. Com cerca 80% da produção voltada para o mercado externo, a empresa possui reservas minerais no Quadrilátero Ferrífero, em Minas Gerais, e escoa a produção através de porto privativo no Rio de Janeiro”. – Site da CAEMI, consultado no dia 14/09/2008 - http://200.150.146.163/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?tpl=home

 

[4]O Movimento Capão Xavier Vivo é um movimento social que congrega diversas pessoas e entidades na luta pela preservação do meio ambiente e dos mananciais de abastecimento público da Região Metropolitana de Belo Horizonte: Ribeirões de Fechos, Mutuca, Catarina e Barreiro, integrantes do sistema Alto Rio das Velhas.” - Site do Movimento Capão Xavier Vivo, consultado no dia 14/09/2008 - http://www.capaoxaviervivo.org.br/

 

[5] Por volta do início do ano de 2007, A Vale incorporou a Minerações Brasileiras Reunidas (MBR) em seus ativos, assumindo 100% da empresa ao comprar as participações dos grupos japoneses.

 

[6] Tradução da autora.

[7] A impermeabilização do solo implica no aumento da velocidade e do volume de escoamento superficial das águas; aumento do número e da freqüência das inundações; incremento da poluição difusa pela lavagem das superfícies urbanizadas. (VARGAS: 1999, p.116)

 

[8] Complementação acrescentada ao Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais no ano de 2002. Organização das Nações Unidas (2002), The Right to Water” (artigos 11 e 12 da Convenção Internacional dos direitos Econômicos, Social e Cultural, Nova York: ONU, disponível em: http://www.citizen.org/documents/ACF2B4B.pdf.

 

[9] Tradução da autora.

[10] A governabilidade centrada em princípios mercantilistas, pressupõe a “(...)idéia de crescimento econômico via industrialização direcionada à exportação de mercadorias, com o objetivo de acumulação de riqueza abstrata no contexto da globalização” (ZHOURI et al.: 2005, p.12).

[11] Para maiores informações sobre o sistema de abastecimento e saneamento de Belo Horizonte ao longo da década de XX, ver: “Saneamento Básico em Belo Horizonte: trajetória em 100 anos - Os serviços de água e esgoto”. Fundação João Pinheiro, Centro de Estudos Históricos e Culturais. Belo Horizonte: 1997.

 

[12] A classificação dos corpos d’água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como  o estabelecimento das condições e padrões de lançamento de efluentes, e outras providências, é feita com base na Resolução Nº 357, de 17 de março de 2005. Para ter acesso a resolução completa com as demais classificações dos corpos d’água, consultar o site do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), disponível em:  http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res05/res35705.pdf

 

[13] As Áreas de Proteção Especial Estadual (APEE) são áreas definidas e demarcadas pelo governo do Estado de Minas Gerais para proteção e conservação de mananciais. Disponível em: site do IEF - http://www.ief.mg.gov.br/.

[14] A Modernização Conservadora pode ser entendida como uma estratégia adotada nos países retardatários, como esforço de recuperação do atraso econômico. Essa medida estava realcionada ao objetivo de preservar a autonomia nacional em face a pressões externas. Como era realizada de cima para baixo, tal estratégia pressupunha o controle autoritário dos setores subalternos e a concentração fundiária, ensejando a exploração da força de trabalho tanto na cidade quanto no campo (DULCI: 1999a, p. 25).

 

[15] As soluções técnicas neste caso, não são regidas pelas condições geofísicas do ambiente, mas sim pelo modelo cultural prevalecente, que atualmente se converge para o modelo hegemônico do desenvolvimento. Segundo esse modelo, os modos de uso, significação e apropriação do território são regidos pelo conhecimento técnico, através do uso mais eficiente possível dos recursos naturais.

[16] O Quadrilátero Ferrífero é onde acontece a maior concentração de minérios do país, de onde são extraídos ouro, ferro, manganês e outros, sendo que o ferro ocupa posição de destaque. Importantes cidades de Minas Gerais como Ouro Preto, Congonhas, Itabira e Nova Lima se encontram nessa região.

 

[17] Segundo reportagem do dia 31/10/2008 de Raul Juste Lores, de Pequim para o Jornal Folha de São Paulo, com o título: “Boicote da China contra Vale agora se torna oficial”, consta que a agência estatal de notícias Xinhua teria publicado texto sobre a suspensão da importação de ferro por uma das maiores siderúrgicas locais, a Jinan, "depois da escalada de preços do fornecedor brasileiro". A Vale quis reajustar em 11% o preço do minério de ferro vendido à China. Segundo a empresa, os chineses pagam 11% menos que os europeus pelo mesmo minério. A Associação de Ferro e Aço da China alega que os contratos já estavam assinados e que o reajuste é ilegal, e decidiu pelo boicote. Esta decisão da China também se relaciona com a crise financeira global que vem contribuindo para a queda de crescimento do país. Com uma produção e demanda que duplicou entre 2000 e 2007, a China é responsável por 40% do aço do mundo e consome 33% de toda a produção do planeta (sendo o principal mercado consumidor externo da Vale).

 

[18] Segundo reportagem do jornalista Álvaro Gribel de 08/02/2008, o Brasil seria hoje o maior exportador de minério de ferro no mundo, pois, segundo pesquisas da consultoria Macquarie Reserarch, teria ultrapassado a Austrália pela primeira vez na história. Tal feito teria sido possível pelo aumento das exportações em virtude do crescimento econômico mundial. E, além da Vale, CSN e Rio Tinto, pequenos produtores de Minas Gerais também contribuíram no resultado. Disponível em http://oglobo.globo.com/economia/miriam/post.asp?t=brasil_o_maior_exportador_de_minerio_de_ferro_do_mundo&cod_Post=89478&a=73

 

[19] A cronologia do Licenciamento da MBR foi retirada de reportagem do dia 25/03/2004, disponível no site “Agência Minas” que fornece notícias do governo do estado de Minas Gerais. Seu acesso está disponível no seguinte endereço: http://www.agenciaminas.mg.gov.br/detalhe_noticia.php?cod_noticia=1414

 

[20] A existência da cava da Mutuca se deve a exploração de minério realizada ao longo de 40 anos de atividade pela empresa MBR. A antiga área de mineração está localizada no município de São Sebastião das Águas Claras, vizinho a atual área de exploração de Capão Xavier. Suas antigas instalações são hoje utilizadas pela MBR enquanto vigorarem os trabalhos na mina atual.

 

[22] A caracterização do Movimento Capão Xavier Vivo, assim como o histórico de suas formação e atuações no caso de Capão Xavier e também uma discussão mais ampla a respeito do tema dos movimentos sociais serão abordadas no terceiro capitulo desta monografia.

[23] Reportagens de jornais que denunciam os casos de desconforto causados pela poeira e barulho das explosões no bairro Jardim Canadá, podem ser encontradas no site do Movimento Capão Xavier Vivo, contanto inclusive com depoimentos dos moradores locais (http://www.capaoxaviervivo.org.br/).

 

[24] O relatório completo pode ser consultado  na PLATAFORMA BRASILEIRA DE DIREITOS HUMANOS, ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS. “Relatorias Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais”. RODRIGUEZ, Maria Elena (org). Rio de Janeiro: 2005.

 

[25]Os professores Helio Alexandre Lazarim, M.Sc. – Professor da UFMG e Celso de Oliveira Loureiro, Ph. D – Professor da UFMG, realizaram uma pesquisa sistemática, através de simulações do rebaixamento da área de lençol freático da mina de Capão Xavier, intitulado: “Rebaixamento das águas subterrâneas na região em torno da jazida de Capão Xavier, Nova Lima, MG – Cenário Futuro”. Disponível no site: http://www.capaoxaviervivo.org.br/

 

[26] O campo ambiental se formula a partir das lutas entre diferentes modos de construir o sentido aos territórios. Neste campo estão inseridos uma pluralidade de segmentos sociais, tanto pertencentes à estrutura deliberativa, quanto sujeitos diversos que lutam para verem contemplados seus discursos e demandas nas decisões políticas deliberadas pelo COPAM.

[27] Grifos do texto.

[28] Nota à imprensa e à sociedade: Movimento Capão Xavier Vivo se pronuncia sobre o relatório final da CPI da MBR (01 de setembro de 2005). Disponível em:

http://www.capaoxaviervivo.org.br/nota01092005.htm

 

[29] Essas ações podem ser acompanhadas no site do Movimento Capão Xavier Vivo, disponível em: http://www.capaoxaviervivo.org.br/

 

[30] Essas considerações estão sempre presentes ao fim de artigos publicados e falas dos integrantes do movimento em participações públicas, reafirmando a posição do movimento.

[31] A “Lista Suja” faz alusão à tradicional lista suja da AMDA, divulgada de 1982 a 2006, com o objetivo de denunciar os maiores responsáveis pela degradação ambiental em Minas Gerais, quais sejam, em geral, as empresas ou empreendimentos poluidores, etc, e que neste caso, o Movimento Capão Xavier Vivo faz uma ressignificação desta lista, incluindo a própria AMDA, os órgãos de meio ambiente, entre outros.

 

[33] Trechos do relato da Caminhada em defesa das Águas de Capão Xavier”. Disponível em: http://www.capaoxaviervivo.org.br/passeatabhte.htm

 

[34] Até então foram realizadas pela MBR: o asfaltamento de algumas ruas, uma passarela para pedestres na rodovia, uma praça de convivência e a instalação de placas educativas e tótens de sinalização.