SÍNTESE DA MANIFESTAÇÃO DO VEREADOR OTÁVIO FREITAS – PARTIDO VERDE (PV) – NA AUDIÊNCIA PÚBLICA SOBRE CAPÃO XAVIER REALIZADA PELA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE MINAS GERAIS, EM 10.03.2004

I. DOS ANTECEDENTES DO EMPREENDEDOR

I.I. DA MINA DO PICO – ITABIRITO

I.II. DA MINA DE ÁGUAS CLARAS – SERRA DO CURRAL – BELO HORIZONTE/NOVA LIMA

I.III. DA ESTRADA DE ESCOAMENTO DE MINÉRIO DE TAMANDUÁ PARA MUTUCA – VALE DE FECHOS – NOVA LIMA

I.III.I. DO CONVÊNIO CELEBRADO ENTRE A MBR/IEF/COPASA/PMBH – JUL/96

  1. Ratificação e anuência prévia pela COPASA, quanto ao "Estudo de Impacto Hidrológico-Mineiro/Ambiental" elaborado pela FRASA Ingenieros Consultores contratada pela MBR;
  2. Anuência prévia, inclusive perante os órgãos ambientais, da COPASA, IEF e MUNICÍPIO ao empreendimento proposto;
  3. Concessão, pela P.M.B.H, de servidão de passagem nas áreas localizadas na Estação Ecológica de Fechos e no Mutuca, indispensáveis à implantação das correias transportadoras/estradas para viabilização da lavra da Mina de Capão Xavier e Mutuca;
  4. Autorização pela C.M.B.H, no que se refere as referidas servidões de passagem;
  5. Adequação pelo IEF, do zoneamento sócio-econômico-ambiental da APA/SUK aos interesses da MBR. Senão, vejamos:
  6. Cláusula 6a "6.1. O IEF, como membro integrante da Comissão Intergovernamental da APA SUL RMBH, assume o compromisso de, durante os trabalhos da referida comissão, buscar a adequação do zoneamento daquela área de proteção ambiental ao desenvolvimento das atividades minerarias nas jazidas de Capão Xavier e Tamanduá, de acordo com as mais modernas técnicas de proteção do meio ambiente";

  7. "O presente Convênio obriga os participes e seus sucessores a qualquer título,..."

I.III.II – PROCESSO DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL – 1998

  1. Quando do licenciamento da Mina de Tamanduá, a afirmativa é de que a preservação de Fechos é fundamental ao equilíbrio ambiental dos ecossistemas existentes na Região;
  2. Posteriormente, quando do licenciamento da referida estrada, esquece-se que a preservação de Fechos é fundamental e, ainda, afirma-se que este manancial seria classificado como "classe 2" sendo, pois, admissível a ocorrência de impactos sobre o mesmo. Contudo, na forma legal, o referido manancial é classificado como "Classe Especial", destinada ao abastecimento público e, portanto, a mais restritiva quanto ao uso, implicando a possibilidade de lançamento de qualquer tipo de efluente líquido ou sólido mesmos tratados;
  3. É sonegada a informação quanto à existência de espécies da fauna e flora ameaçadas de extinção em Fechos, a despeito da existência e implantação de programa de reintrodução destas espécies.
  4. Em atendimento aos termos do Convênio celebrado, o Prefeito Célio de Castro encaminha o Projeto de Lei no. 356/98, visando obter autorização para instituir as servidões de passagem nos Mananciais de Fechos e Mutuca em favor do Empreendedor;
  5. Em 16.09.98, o Prefeito Célio de Castro é informado das impropriedades constantes do Convênio celebrado entre a MBR, IEF, COPASA e PMBH;
  6. Em 17.08.98, é encaminhado Representação ao Ministério Público denunciando os termos do referido Convênio, em especial, a cláusula 6a, ou seja:
  7. 6.1. O IEF, como membro integrante da Comissão Intergovernamental da APA SUL RMBH, assume o compromisso de, durante o trabalhos da referida comissão, buscar a adequação do zoneamento daquela área de proteção ambiental ao desenvolvimento das atividades minerarias nas jazidas de Capão Xavier e Tamanduá, de acordo com as mais modernas técnicas de proteção ao meio ambiente.

  8. Em depoimento prestado no M.Público, o Representante Legal do IEF reconhece que a cláusula 6a não atende aos Princípios da Administração Pública, comprometendo-se a adequá-lo sem, contudo, fazé-lo no prazo concedido;
  9. Em 18.09.98, a S.M.M.A de Belo Horizonte, emite Parecer Técnico contrário a Proposição de Lei no. 356/98, nos seguintes termos:

"(...).

A matéria deve ser abordada tendo em vista os aspectos expostos a seguir:

    1. O empreendimento encontra-se em fase de licenciamento ambiental junto à FEAM – Fundação Estadual de Meio Ambiente e Copam – Conselho Estadual de Política Ambiental, não havendo, até o momento, qualquer deliberação conclusiva sobre o caso;
    2. O assunto foi analisado, preliminarmente, por esta SMMA em 10.07.96, quando, entretanto, não havia sido efetuado o enquadramento das águas da Bacia do Rio das Velhas, circunstâncias estas que constituem fato novo;
    3. O enquadramento foi efetuado através da Deliberação Normativa Copam no. 20/97, publicada no "Minas Gerais" em 27.06.97, após audiências públicas realizadas com os usuários da bacia, que decidiram as classes de uso admissíveis para os corpos d’água em questão;
    4. Os corpos d’água inseridos na área do empreendimento foram enquadrados como Classe Especial, a saber|:
    5. * córrego dos Fechos, das nascentes até o limite jusante da Área de Proteção Especial Fechos e Estação Ecológica dos Fechos (Sub-bacia do Ribeirão dos Macacos – Trecho 38); e

      * córrego da Mutuca, das nascentes até o limite ajusante da Área de Proteção Especial Mutuca, com captação d’água para o Município de Belo Horizonte (Sub-bacia do Ribeirão Água Suja/Cardoso – Trecho 42);

    6. Os corpos d’água enquadrados como Classe Especial são aqueles destinados: ao abastecimento doméstico, sem prévia ou com simples desinfecção; e à preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas;
    7. A classificação de enquadramento é feita através da qualificação das águas com base nos usos preponderantes (sistema de classe de qualidade);
    8. O enquadramento Classe Especial é o mais restritivo quanto ao uso, implicando a impossibilidade de lançamento de qualquer tipo de efluente líquido ou sólido mesmo tratados, sob pena de sua não-efetivação. É o que dispõe a Deliberação Normativa Copam no. 020/86, art. 12, verbis: "Nas águas de Classe Especial não serão tolerados lançamentos de águas residuárias, domésticas e industriais, lixo e outros resíduos sólidos, substâncias potencialmente tóxicas, defensivos agrícolas, fertilizantes químicos e outros poluentes, mesmos tratados".
    9. Qualquer interferência em corpo d´água Classe Especial requer a conseqüente modificação da deliberação de enquadramento citada, mediante observância de todo procedimento regulamentar, que compreende, além da reavaliação dos estudos técnicos pertinentes, a convocação das audiências públicas, a aprovação pela Câmara Técnica competente e, finalmente, pelo Plenário do Copam.

Por último, vale ressaltar que a viabilização ambiental do empreendimento depende de modificação do enquadramento das águas da bacia, que, como se pode verificar, é de responsabilidade do Copam, por se tratar de águas de domínio estadual, conforme estabelecido pela Constituição Federal.

Pelo exposto, o posicionamento conclusivo desta SMMA sobre a matéria encontra-se prejudicado quanto aos reflexos ambientais da Proposição de Lei em apreço.

Belo Horizonte, 18 de setembro de 1998. Paulo Maciel Júnior – Secretário Municipal Adjunto de Meio Ambiente."

  1. Em 23.09.98, é publicado no DOM, as razões de VETO INTEGRAL, do Prefeito Célio de Castro, nos seguintes termos:
  2. "Ao analisar a Proposição de Lei no. 356/98, que "Autoriza a instituição de servidão de passagem em favor dos prédios constituídos pelas áreas adjacentes do Parque Estadual do Rola-Moça e Estação Ecológica dos Fechos", sou levado a opor-lhe veto integral, conforme fundamentos adiante expostos.

    Nos termos do parecer emitido pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, nota-se que o convênio que originou a Proposição ora em exame, foi elaborado quando ainda não se havia efetuado o enquadramento das águas da Bacia do Rio das Velhas.

    Com a realização de tal enquadramento, afigura-se necessária, para que referida Proposição seja levada a cabo, a sua adequada modificação, devendo-se proceder a novos estudos técnicos, à convocação de audiências públicas, à aprovação da matéria pela Câmara Técnica competente e pelo Plenário do Copam.

    Tais medidas são de extrema necessidade para garantia de que o Projeto em análise não causará impactos negativos nas condições ambientais da região sobre a qual incide. Afinal, conforme dispõe o artigo 225 da Carta Política de 1988, "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendé-lo para as presentes e futuras gerações."

    Pelo exposto, veto integralmente a Proposição de Lei no. 356/98, devolvendo-a ao reexame da Egrégia Câmara Municipal."

  3. Posteriormente, a C.M.B.H. mantém o veto proferido;
  4. Passados alguns meses, a MBR encaminha ao COPAM pedido de desistência do referido processo de licenciamento.

I.IV. EXTRAVAZAMENTO DA BARRAGEM DA GROTA FRIA – MINA DE TAMANDUÁ – NOVA LIMA – FEV/2000

I.IV.I. FEAM

  1. Auto de Fiscalização 237/94, lavrado em 02. e 07.02.2000, relatando o "intenso carreamento de resíduos sólidos das áreas e fontes situadas a montante, implicando no completo assoreamento da bacia de barramento fazendo com que o sistema vertedouro (tulipa) fosse obstruído e permitindo a passagem de resíduos sólidos de forma inadequada, causando degradação ambiental em função do lançamento desses resíduos, comprometendo a qualidade do efluente final da barragem (no momento da fiscalização a turbidez das águas estava visivelmente fora do padrão natural)...."
  2. Em 02 e 07.02.2000, é lavrado o Auto de Infração no. 14/2000, por "Emitir ou lançar efluentes líquidos e resíduos sólidos, causadores de degradação ambiental, em desacordo com o estabelecido nas Deliberações Normativas; e causar poluição ou degradação ambiental que provoque destruição ou outros efeitos adversos à biota nativa ou às plantas cultivadas e às criações de animais (barragem da Grota Fria)"

I.IV.II. IEF

  1. Em 08.02.2000, é elaborado Laudo Técnico de Fiscalização Florestal, identificando as seguintes consequências:

"(...).

3 – Como foi contido o processo de assoreamento inicial, nas "baixadas" (pequenas várzeas), a vegetação apresentava um processo lento de regeneração natural, devido a probreza de substâncias orgânicas no material escoado, apresentando vegetação arbustiva e sub arbustiva, com presença de alguns indivíduos de Aroeirinha Vermelha, Goiabeira, Folha Miúda, Arranha-Gato, Maria Preta e outras típicas;

4 – O acidente verificado no dia 31/01/00 promoveu o soterramento de grande parte da vegetação que estava em processo de regeneração como também invadiu várias áreas de Matas Ciliares, soterrando todo o sub bosque com camadas de material sólido que variam, conforme a topografia, de 0,30 a 1,00 m de altura;

5 – Calculamos que, aproximadamente, 08 KM de leito de Córrego tenham sido atingidos com a deposição de material sólido em suas margens, proporcionando assim, uma área estimad de 10,00,00 há de vegetação ciliar, descontínuas, atingida diretamente;"

CONCLUSÕES:

"1 – Concluímos que a Empresa Mineraçõe Brasileiras Reunidas S/A MBR – é responsável pelo material escoado para a sub bacia do Ribeiro Macacos devido a atividade Mineraria exercida à montnte do Córrego Grota Fria;

2 – Houve danos significativos à vegetação ciliar causando morte, por soterramento de várias espécies vegetais, principalmente herbáceas, impedindo, inclusive, a regeneração natural que ali se processava."

MEDIDAS LEGAIS E ADMINISTRATIVAS APLICADAS E SUGERIDAS:

"1- Emissão de Auto de Infração no 188004 datado de 08/02/00, ..., "por danificar, provocar morte e impedir a regeneração natural de vegetação considerada de Preservação Permanente, através de assoreamento e soterramento com sub produtos de atividade minerarias.

2- Sugerimos que, além da reparação ambiental da área atingida prevista na cominação do no. de ordem 2 do anexo ao artigo 25 da Lei Estadual no. 10.561/91, com apresentação de Projeto de Reparação Ambiental e de Recomposição da Flora, seja, a Empresa autuada, submetida às determinações do artigo 8o parágrafo 3o da Lei 10.561/91, artigo 40 e seus parágrafos do Decreto Estadual 33.944/92 e Portaria – IEF – 029/94, pois todo o conjunto de ações, causas e efeitos estão diretamente ligados a atividade mineraria exercida pela citada Empresa."

I.IV.III. COPASA

1) RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO AMBIENTAL – ALTERAÇÕES NA VAZÃO E QUALIDADE DA ÁGUA DO RIBEIRÃO DOS MACACOS, DE 02.02.2000:

"(...).

III. CONCLUSÃO

A paralisação do sistema de extravasamento de água da barragem, aliado aos altos índices pluviométricos ocorridos no período, causou a degradação do Córrego Grota Fria, atingindo o Ribeirão dos Macacos, tendo assoreado todo o leito de ambos mananciais e provocado altos índices de turbidez em suas águas.

Estas alterações foram significativas a ponto de inviabilizar a utilização pela COPASA da alça esquerda do sistema de Captação do Rio das Velhas.

IV. RECOMENDAÇÕES

É fundamental a implementação de medidas corretivas que possam coibir a continuidade do carreamento dos sedimentos para os mananciais.

Considerando a grande quantidade de sedimentos depositados no leito e nas margens do Córrego Grota Fria e do Ribeirão dos Macacos, que constitui uma fonte contínua de sedimentos para o Rio das Velhas, torna-se necessária a recuperação do leito original dos referidos mananciais, inclusive a estabilização e contenção do material depositado nas margens."

2) OFÍCIOS EXPEDIDOS AOS SECRETÁRIOS DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E DE MINAS E ENERGIA, EM 16.03.00

"(...).

Conforme é do conhecimento de V.Exa., registrou-se no mês de fevereiro um gravíssimo extravasamento de minério causando o assoreamento dos Ribeirões Grota Fria, Marumbé e Macacos, no Alto Rio das Velhas. Este acidente causou sérios transtornos à população local, além de ter causado altos índices de turbidez nos referidos mananciais. Cabe ressaltar a importância desses contribuintes do Rio das Velhas, para a captação de Bela Fama, responsável pelo abastecimento de água para cerca de 70% de Belo Horizonte e 45% das demais cidades atendidas por aquele sistema na RMBH.

Diante desse fato, e considerando a grande responsabilidade que cabe a esta Empresa no tocante à garantia do abastecimento de água à população, bem como na preservação dos mananciais da Região Metropolitana, vimos solicitar o especial empenho de V.Exa. no que se refere à adoção de medidas visando a recuperação do leito original dos referidos mananciais, inclusive a estabilização e contenção do material depositado nas margens, ao longo dos 08 Km atingidos.

Prevalecendo do ensejo par também solicitar a V.Exa. o indispensável apoio dessa Secretaria no desenvolvimento de ações que favoreçam a perenização dos recursos hídricos do Alto Rio das Velhas, de importância estratégica para a COPASA. Nesse sentido, vemos como importante a criação, como medida compensatória por parte da empresa infratora, de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN, abrangendo as cabeceiras dos mananciais contribuintes do Ribeirão Macacos, em área estimada de 350 há de propriedade da mesma, situada entre a Mina do Tamanduá e Estação Ecológica dos Fechos, conforme proposta das Organizações Não Governamentais da APA-SUL.

Certo da acolhida por parte dessa Secretaria à presente solicitação, colocamo-nos ao inteiro dispor de V.Exa., ratificando nesta oportunidade, o nosso elevado apreço e consideração."

I.IV.IV. MANIFESTAÇÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA APA SUL – RMBH

O Conselho Consultivo da APA-SUL-RMBH após análise dos fatos ocorridos e dos danos ambientais causados acata e propõe a adoção das medidas sugeridas pela FEAM, IEF e COPASA, bem como ressalta a necessidade de proteção e preservação da Bacia do Ribeirão Macacos que apresenta expressiva e relevante áreas de cobertura vegetal na APA SUL. Acata e propõe ainda a adoção das medidas sugeridas pela:

ASSOCIAÇÃO COMUNITÁRIA DE MACACOS

Solicitação de auditoria à FEAM com relação ao cumprimento das condicionantes ao licenciamento do Projeto Tamanduá;

AMA MACACOS

Priorizar e cumprir o ressarcimento pelos danos materiais das populações atingidas;
Recuperar o trecho assoreado dos mananciais da Grota Fria e Macacos;
Estabelecer medidas compensatórias que garantam a efetiva proteção das nascentes, matas ciliares e condições favoráveis à recuperação da biota aquática;
Designar um conselheiro da Câmara de Recurso Hídricos para acompanhamento das negociações da comunidade com a infratora

ASSOCIAÇÕES AMBIENTALISTAS DA APA SUL

Convocar a empresa infratora em caráter de urgência para reunião com as associações envolvidas visando o estabelecimento do processo formal de negociação das medidas mitigadoras e compensatórias dos danos, propondo que a Superintendência de Políticas Ambientais da SEMAD assuma a intermediação entre as partes;

Empenho da SEMAD para que se façam cumprir medidas eficazes de recuperação dos ribeirões assoreados;

Criação de Reserva Particular do Patrimônio Natural correspondendo uma área de 350 há de uso múltiplo abrangendo as matas ciliares, nascentes e cabeceiras dos ribeirões Grota Fria, Tamanduá e Marumbé objetivando garantir as seguintes condições: efetiva proteção das nascentes, preservação das condições para continuidade dos hábitos da população local, viabilidade econômica de atividades integradas aos ecossistemas locais tais como apicultura, minimização dos danos sobre atividades do turismo, minimização dos danos sobre a qualidade da água e garantia das condições favoráveis à recuperação da biota aquática e constituição de um corredor de vida Silvestre.

O Conselho Consultivo da APA-SUL/RMBH faz, ainda, as seguintes observações:

Registre-se que a MBR em 07/07/1998 já havia sido autuada no Complexo Tamanduá por lançamento de efluentes e resíduos sólidos, causadores de degradação ambiental, reconhecendo em sua defesa apresentada ao COPÀM em 23/07/98 que "apesar da detecção e da intenção de correção desses problemas ambientais houve um certo atraso nas medidas corretivas dos mesmos, sendo assim justificado o auto de infração".

Este fato configura a reincidência de problemas ambientais graves que vêm degradando este importante manancial da região da APA SUL, afluente do Rio das Velhas, responsável pelo abastecimento de 62% da população da RMBH

Outro agravante que merece ser registrado é que a MBR S.A, até a presente data, não cumpriu com a totalidade das medidas acordadas junto a comunidade de São Sebastião das Águas Claras quando do licenciamento corretivo do Complexo Tamanduá. Tais medidas foram apresentadas no Programa de Acompanhamento de Medidas Mitigadoras e Compensatórias sobre o Meio Antrópico da MBR,..."

Desdobramentos: Até o momento, os danos ambientais causados não foram recuperados, inclusive no que se refere ao dessassoreamento dos mananciais e a recomposição da flora. Também não foi estabelecida e nem implantada nenhuma medida compensatória.

I.V. DO EXTRAVAZAMENTO DA BARRAGEM DE DECANTAÇÃO DE SÓLIDOS/REJEITOS DA MINA DE TAMANDUÁ – NOVA LIMA – EM 27.02.04

Em decorrência de provável deslizamento de terra junto ao corpo da referida barragem, a galeria de escoamento da sua antiga tulipa/vertedouro sofreu rachadura na sua estrutura, o que possibilitou o carreamento de grande quantidade de sedimentos sólidos (rejeitos) para o Córrego Capão da Serra, contribuinte do Sistema Alto Rio das Velhas, cuja captação de Bela Fama/COPASA, a jusante, é responsável por cerca de 70% do abastecimento público da Capital e 45% de sua Região Metropolitana.

O referido extravazamento contribui para o processo de assoreamento deste manancial, bem como comprometeu a qualidade ambiental do mesmo, alterando de forma substancial e significativa os padrões mínimos de qualidade de suas águas.

Diante disto, foi lavrado pela FEAM o Auto de Infração no. 932/2004, por emitir ou lançar efluentes líquidos e resíduos sólidos, causadores de degradação ambiental, em desacordo com o estabelecido nas Deliberações Normativas;

Portanto, manifesta a reincidência em degradação ambiental, inclusive sobre mananciais contribuintes do sistema de abastecimento público da Capital e sua Região Metropolitana, o que comprova, de forma exaustiva, que o risco no desenvolvimento da atividade minerária é inerente, independentemente da observância e utilização ou não, da boa técnica e tecnologia de ponta.

II. DO PROJETO DA MINA DE CAPÃO XAVIER

II.I. DO COMPLEXO MINERÁRIO DA MBR NA REGIÃO SUL DE BELO HORIZONTE E DA CUMULATIVIDADE DE SEUS IMPACTOS SÓCIO-ECONÔMICO-AMBIENTAIS

Os procedimentos adotados neste licenciamento, com exclusão dos impactos cumulativos decorrentes da explotação das Minas de Tamanduá, Capitão do Mato e Mutuca, bem como das Minas de Águas Claras e Pico, dentre outras, e, ainda, dos impactos futuros decorrentes de outros licenciamentos minerários em andamento, tais como a Mina do Gama, como também dos demais decretos de lavra existentes no maciço da Serra da Moeda, todos da MBR e integrantes de um único e grande Complexo Minerário – são insuficientes ao necessário e imperioso resguardo do meio ambiente e da população.

Por outro lado, o hiato existente entre os estudos ambientais apresentados, as licenças concedidas pelo COPAM, o desenvolvimento das atividades minerárias e a realidade vivida pelas Comunidades localizadas no entorno, sem nos esquecermos das dificuldades e precariedades públicas quanto à fiscalização e monitoramento destas atividades, bem como o não cumprimento das obrigações assumidas ou, no mínimo, de forma adequada à Lei e/ou aos acordos/entendimentos celebrados entre as comunidades locais, empresas e órgãos públicos têm comprometido o meio ambiente e a qualidade de vida da população presente, constituindo séria ameaça às gerações futuras.

II.II. DAS ÁREAS AMBIENTAIS, DOS SEUS OBJETIVOS E LEGISLAÇÕES APLICÁVEIS

  1. A Lei Estadual no 13.960/2001, que "Declara como área de proteção ambiental a região situada nos municípios de Barão de Cocais, Belo Horizonte, Brumadinho, Caeté, Catas Altas, Ibirité, Itabirito, Mário Campos, Nova Lima, Raposos, Rio Acima, Santa Bárbara e Sarzedo e dá outras providências", "tem por objetivo proteger e conservar os sistemas naturais essenciais à biodiversidade, especialmente os recursos hídricos necessários ao abastecimento da população da região metropolitana de Belo Horizonte e das áreas adjacentes, com vistas à melhoria da qualidade de vida da população local, à proteção dos ecossistemas e ao desenvolvimento sustentável" (destacamos e grifamos);
  2. Os Decretos Estaduais nos 22.327/82, 21.372/81, 22.091/82 e 22.096/82, respectivamente, definem que os mananciais de Fechos, Mutuca, Barreiro e Catarina são áreas "de interesse especial, para proteção de mananciais". (grifamos e destacamos);
  3. A DN COPAM 020/97 enquadra os mananciais de Fechos, Mutuca e Barreiro na "Classe Especial", destinados ao abastecimento doméstico, sem prévia ou com simples desinfecção; e à preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas;
  4. A DN COPAM 020/86 dispõe que "Nas águas de Classe Especial não serão tolerados lançamentos de águas residuárias, domésticas e industriais, lixo e outros resíduos sólidos, substâncias potencialmente tóxicas, defensivos agrícolas, fertilizantes químicos e outros poluentes, mesmos tratados"
  5. A Lei Estadual no. 10.793/92, que "DISPÕE SOBRE A PROTEÇÃO DE MANANCIAIS DESTINADO AO ABASTECIMENTO PÚBLICO DO ESTADO.’, estabelece no "caput" do art. 4o, inciso II, que:

"Art. 4o – Fica vedada a instalação, nas bacias de mananciais dos seguintes projetos ou empreendimentos que comprometam os padrões mínimos de qualidade das águas:

II – atividade extrativa vegetal ou mineral;"

Por outro lado, no seu art. 6o, a referida norma Estadual dispõe, de forma taxativa, quais as atividades permissíveis, ou seja:

" Art. 6o – São atividades permissíveis nas bacias de mananciais, ressalvada a competência da União:

I – o turismo ecológico, excetuado o campismo;

II – a pesca;

III – a atividade agropecuária em escala compatível com preservação ambiental;

IV – a produção hortifrutigranjeira e agrícola, desde que respeitados os limites impostos por esta Lei;

V – o uso de irrigação, desde que a quantidade de água captada não implique diminuição significativa de vazão;

VI – a piscicultura"

5.1) Aspectos fáticos:

  1. Nos estudos encaminhados ao Órgão Ambiental inexiste referência a Lei 10.793/92;
  2. O Órgão Ambiental, a despeito de oficialmente questionado sobre a existência e aplicabilidade da referida Lei Estadual, não se manifestou. Ressalte-se, por oportuno que, na forma legal, o enfrentamento desta norma deveria ter ocorrido na fase de Licença Prévia, quando da avaliação de viabilidade legal e ambiental do empreendimento;
  3. A vedação legal alcança, não apenas o comprometimento dos padrões mínimos de qualidade das águas mas, também e obviamente, o risco de comprometimento;
  4. O Empreendedor é reincidente em "não conformidade" ambiental sobre os recursos hídricos, sendo certo ainda, que o risco, repetindo, é inerente a atividade mineraria;

II.III. DO MICROCRUSTÁCEO

  1. A despeito do conhecimento prévio, nos estudos inicialmente encaminhados ao Órgão Ambiental, é omitida a existência de microcrustáceo, verdadeiro fóssil vivo, de milhões e milhões de anos;
  2. O microcrustáceo é endêmico; As tentativas de relocação não obtiveram sucesso;
  3. Ainda que se obtenha sucesso na relocação, argumentando, serão necessários algumas dezenas de anos para que a Sociedade tenha certeza da perpetuação da espécie.

II.IV. DA CAVIDADE NATURAL – "CAVERNA DE CAPÃO XAVIER"

  1. Os estudos encaminhados não fazem referência à Cavidade Natural/Caverna, sendo certo ainda, que tal fato deveria ter sido objeto de análise na fase de LP;
  2. Estudo realizado por especialistas, afirma que:
  3. "...as cavidades naturais em canga laterítica e hamatita compacta foliada são raras, onde das 3.515 cavernas cadastradas na Sociedade Brasileira de Espeleológia (SBE), apenas 7 cavernas (Tabela 1) se desenvolvem em canga laterítica e nenhuma, até então, havia sido cadastrada com litologia do tipo hematita compacta foliada.

    (...)."

  4. Após o encaminhamento deste estudo, o Empreendedor, inicialmente, negou a existência da Cavidade Natural/Gruta, alegando tratar-se de resultado de prospecção mineral e/ou lavra. Posteriormente, admitiu a existência da mesma, passando a sugerir a inexistência de expressão espeleológica e ambiental. Em igual sentido, o IBAMA, contudo, não declara se a mesma pode ou não ser impactada e/ou suprimida;
  5. O inciso X do artigo 20 da Constituição Federal dispõe que "são bens da União as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos" e o Decreto Federal no 99.556 de 01/10/1990 estabelece, em seu caput, que "as cavidades naturais subterrâneas existentes no Território Nacional constituem patrimônio cultural brasileiro, e, como tal, serão preservadas e conservadas de modo a permitir estudos e pesquisas, de ordem técnico-científica, bem como atividades de cunho espeleológico, étnico-cultural, turístico, recreativo educativo", sendo certo ainda, que em seu artigo segundo, caput, estabelece que "a utilização das cavidades naturais subterrâneas e de sua área de influência deve fazer-se consoante a legislação específica, e somente dentro de condições que assegurem sua integridade física e a manutenção do respectivo equilíbrio ecológico";
  6. Em igual sentido, o disposto na Portaria no 887, de 15/06/1990, do IBAMA, especialmente os artigos 3o, 5o e 6o;
  7. Para a análise técnica e jurídica da viabilidade ambiental deste empreendimento, é imperiosa a apresentação prévia, para análise na fase de Licença Prévia, de Estudo Espeleológico - inclusive abordando questões específicas quanto às relações existentes entre as formações geospeleológicas locais e a "gêneses" dos aqüíferos e mananciais existentes nesta Região - e de Estudo Bioespeleológico, com os devidos pareceres dos órgãos responsáveis, em planos federal e estadual, pela proteção do patrimônio cultural.

II.V. DA AVALIAÇÃO DA EQUIPE TÉCNICA CONTRATADA PELA P.M.B.H, BOTTURA CONSULTORIA, SOLOS E ÁGUAS SUBTERRÂNEAS, EM RELAÇÃO AOS ESTUDOS ELABORADOS PELA FRASA

O estudo técnico elaborado pela empresa Bottura Consultoria, Solos e Águas Subterrâneas, contratada pela P.M.B.H. para avaliar tecnicamento o trabalho desenvolvida pela empresa contratada pelo Empreendedor, FRASA, recomenda que:

"(...).

As incertezas envolvidas nos resultados apresentados pela modelagem hidrogeológica realizada, abrangem aspectos qualitativos e quantitativos, decorrentes da falta de um acervo de informações hidrogeológicas e hidráulicas consistentes da área estudada, heterogeneidades geológicas e hidrogeológicas, principalmente as estruturais que induzem um alto nível de complexidade hidrogeológica ao modelo conceitual, mas também envolvem incertezas decorrentes da formulação interpretativa do meio hidrogeológico.

Frente a este quadro de incertezas, nenhuma tomada de posição poderá ser realizada sem uma profunda revisão do modelo formulado, com posterior análise de sensibilidade para reajuste da sua formulação e avaliação preditiva das ações a serem simuladas. (...)."

II.VI. – DO LAGO A SER FORMADO

  1. Os estudos apresentados não abordam a possibilidade de comprometimento da qualidade das águas do referido lago, em decorrência de processos naturais de oxidação de minerais inertes e localizados no sub-solo, após contato com o ar e a água;
  2. A grande profundidade do lago a ser formado, combinado com as altas temperaturas em longos períodos do ano na região, podem vir a contribuir para o comprometimento da qualidade de suas águas, especialmente, na hipótese de contato com material orgânico

II.VII. – DA PARTICIPAÇÃO ATUAL DA P.M.B.H.

  1. a P.M.B.H., à revelia do COMAM e da C.M.B.H., bem como em manifesta ofensa ao P.T. da SMMA e do veto integral do Prefeito de Célio de Castro ao PL que visava autorizar a instituição de servidão nos mananciais da Mutuca e Fechos em favor do Empreendedor, opta por autorizá-la.

III. DOS ASPECTOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS

A mudança da capital de Minas, "para um local que oferecendo as precisas condições higiênicas, se preste à construção de uma grande cidade", foi determinada pela Constituição mineira de 1891 (Disposições Transitórias, art. 13). A Lei Adicional n. 1 à Constituição determina a realização de estudos em Belo Horizonte, Paraúna, Barbacena, Várzea do Marçal e Juiz de Fora, tendo sido nomeado o engenheiro Aarão Reis para chefiar a Comissão de Estudos das Localidades. Entre as instruções baixadas pelo governo do Estado, para pautar os trabalhos da Comissão, citamos: "1o) as condições naturais de salubridade [...]; 2o) abastecimento abundante de água potável, devendo ser examinados os mananciais que puderem ser aproveitados, não só quanto ao volume e qualidade das águas, mas também quanto à altura disponível [...]".

Em novembro e dezembro de 1893, de posse do Relatório da Comissão de Estudos das Localidades, reuniu-se extraordinariamente o Congresso mineiro, em Barbacena, para levar a efeito a definição da nova sede da capital - sendo Belo Horizonte escolhida, e promulgada a Lei no 3, adicional à Constituição.

No "Relatório apresentado a S.Exa. o Sr. Dr. Affonso Penna (Presidente do Estado) pelo Engenheiro Civil Aarão Reis", em 1893, referente aos estudos das localidades indicadas para a nova capital, já se indicava que,

"para recurso de futuro [...] os ribeirões dos Macacos e da Pantana, qualquer deles mais importante que o do Arrudas, [...] poderão ser canalizados para o serviço da nova cidade, quando esta atingir as proporções correspondentes à necessidade de tais trabalhos".

Na "Mensagem" de 1927, o então prefeito Christiano Monteiro Machado, ao tratar dos mananciais de Rola Moça e Capão do Balsamo ou Capão de Baixo (atividade para "um quatriênio", registrou), lembrava que embora fosse aquela "uma grande realização", Belo Horizonte "não mais" permitia "as soluções de retalho, que se fazem num dia para reviverem no imediato. Eis porque cuidarei de proceder a estudos de novos mananciais, procurando desapropria-los para resguardo futuro".

Semelhante consideração foi levantada, em 1930, no Relatório Geral dos Serviços do Novo Abastecimento D’Água de Belo Horizonte, pelo chefe dos serviços, Octacílio Negrão de Lima, que - informando sobre a situação do abastecimento regular de água da cidade - diagnosticava patentear-se a clara "necessidade de aduzirem-se novos mananciais para a população da cidade" e que "ao lado da situação precária da população existente, forçoso se tornava considerar o aumento daquela [população], dia a dia crescente. A solução do problema não se podia limitar ao estado atual. Seria uma solução infeliz a que debelasse o mal apenas no presente. Cumpria abastecer a população até aqui desprovida de água e abrir à cidade ampla possibilidade de progresso", e "projetar o serviço da nova captação, na previsão do desenvolvimento da Capital, até o ano de 1950";

No "Relatório dos Exercícios de 1940 e 1941", o Prefeito Juscelino Kubitschek de Oliveira rememorava e propunha:

"Desde a fundação da capital, o problema do abastecimento de água potável tem sido motivo dos mais demorados estudos. A própria Comissão Construtora, ao tempo do início da metrópole mineira, tratou do assunto, visando proporcionar à cidade que então se formava, uma situação de desafogo por muitos anos". Mas,

"em pouco, verifica-se, que tais estudos não podiam ser aproveitados, por absoluta impossibilidade de captar as fontes enumeradas [os doze afluentes do Arrudas]"; e que "os períodos de carência da água potável, de tempos a tempos, têm-se tornado críticos, provocando da Municipalidade estudos e trabalhos de relevância. Em 1910, verificou-se a necessidade do primeiro aumento [...]. Iniciaram-se, então, pouco depois, as obras de captação das águas do Barreiro [...].Passaram-se alguns anos e a capital, com seu vertiginoso progresso, reclamou novos aumentos [...]. Em 1927, havia chegado o período crítico, provocando novos estudos. Iniciou-se, então, em meados de 1928, a canalização dos córregos "Rola Moça" e "Tabuões", em Ibirité". Mas, "desde 1938 a situação se vem agravando"; "ao iniciarmos o nosso governo, tratamos de estudar a questão com o máximo de interesse, para que novas fontes fossem anexadas à rede da cidade" e "verificamos, então, que, atualmente o manancial mais indicado para utilização é o do Mutuca", "estando em estudos" a aquisição da bacia "de apenas 1.026 ½ hectares" "para proteger-se de intromissão estranha".

E acrescentava JK:

"outra vantagem no aproveitamento do Ribeirão do Mutuca é a possibilidade da captação futura do Córrego dos Fechos [...] situado a 7 quilômetros além do Mutuca, com uma capacidade de 30.000 m.c. diários, no período das secas, [...] com a vantagem ainda de estar em nível muito elevado – a 1.103 metros – podendo-se construir um reservatório no alto do Morro do Mendonça, na capital, a 1.040 metros com o que se abastecerá toda a cidade nas suas partes mais altas"; "com o aproveitamento desses dois mananciais", Belo Horizonte contaria "com mais de 60.000 m.c. diários na época das secas, atendendo a mais do dobro da população, que, de acordo com os cálculos baseados nos índices atuais, deverá estar em 400.000 habitantes em 1960". "O trabalho que temos diante de nós é de vulto, quer quanto à sua finalidade, quer quanto ao custo das obras, principalmente nesta quadra, quando a guerra nos impõe tremendas dificuldades. Por tudo isso, temos orientado os estudos de captação do Mutuca dentro do mais sério rigor [...]".

Em 1948, o Município reconhecia "a luta diária do povo contra a falta dágua e os perigos que o ameaçavam por não ser possível assegurar em bom nível o estado sanitário da população"; tendo sido "esse [...] um dos mais sérios problemas com que defrontou a administração". "Ao terrível drama da enchente" sucedia "o da seca, nunca registrada na zona de que Belo Horizonte é o centro. A água, já insuficiente para o consumo livre do povo, desceu a 40% do fornecimento normal, exigindo o problema medidas excepcionais de economia e distribuição", tendo a Prefeitura, inclusive, até mesmo levado "água, através de caminhões-tanques, às ruas mais sacrificadas". A cidade não se teria livrado "do terrível flagelo da sede, com que teria que lutar, se não pudesse valer-se das águas do Mutuca" .

Assim, "no quadro final da seca de 1948", o "abastecimento da cidade" é reforçado em 30%.

O Município vence o desafio com enormes esforços e dificuldades, assim apresentados no Relatório do Prefeito Octacílio Negrão de Lima, de 1948, com referência ao desenvolvimento da captação do Mutuca:

  1. a "árdua e penosa" "labuta para vencer os múltiplos obstáculos [...] à execução dos serviços" para a construção da Barragem dos Cristais ("acesso difícil", "condições desfavoráveis do transporte de terra", "custoso apiloamento de boa parte do aterro", topografia desfavorável ao "emprego generalizado de máquinas" e "a situação desvantajosa dos empréstimos"), que, "após 27 meses de trabalho", achando-se a construção desta barragem em estado bastante adiantado, foi arrombada, em dezembro de 1948, por uma enchente, tendo sido suspensa a obra, que já implicara ao Município a despesa de "cerca de Cr$7.022.770,20";
  2. a "enorme dificuldade [...] encontrada durante todo o trabalho de perfuração [do túnel sob a Serra do Curral], por causa da natureza incerta do terreno a atravessar e ao grande afluxo de água no interior das galerias. A penetração no maciço da serra, constituído de rochas estratificadas de vários tipos, retorcidas, fendilhadas e alteradas", impondo "cuidados e improvisações constantes que retardaram demasiado a execução da obra", cujos serviços somaram Cr$ 6.018.407,20;
  3. a aquisição, da Companhia Ferro Brasileiro S. A., de "10.940 metros de tubos de ferro fundido centrifugado [...] e todas as peças, conexões e registros necessários" ao custo de Cr$5.681.000, do total de Cr$7.813.000 para a construção da adutora, obra esta que atendeu ao que antecipara o Relatório de 1940-41, ao registrar que esta captação teria que empregar "canalização resistente, devido às depressões violentas na passagem dos vales, o que acarretará enorme pressão sobre os tubos".
  4. Em 1956, no Relatorio apresentado à Camara Municipal, o Prefeito Celso Mello de Azevedo informava: "o problema do abastecimento de água tornou-se crítico para a Cidade de Belo Horizonte", e citava várias providências, a conclusão das desapropriações das "terras marginais aos córregos do Mutuca e Fechos", à St. John Del Rei Mining Company Ltd., pela quantia de Cr$16.500.000,00, a assinatura de contrato com a Companhia Ferro Brasileiro "num total superior a Cr$ 12.000.000,00, para fornecimento de encanamentos que servirão, em sua maior parte, à conclusão de adutora que ligará a adutora de Fechos ao reservatório de Morro Redondo". E ressaltava:

    "o planejamento da solução do problema da água na Capital não pode ficar adstrito unicamente ao fator ‘consumo atual’. Trata-se do futuro da cidade e, para isso, a administração tem de oferecer garantias, traduzidas em generosa reserva de abastecimento, a fim de assegurar expansão demográfica e confiança aos empreendimentos de natureza particular que queiram se fixar no Município. Trata-se, ademais, de assegurar tranquilidade aos belo-horizontinos e às administrações municipais vindouras".

    Ficam nítidos, pelo até aqui exposto (e em vista dos conhecimentos geográficos elementares sobre nossa região), dois aspectos, referentes ao abastecimento de água da jovem capital mineira, Belo Horizonte:

    a] Desde o relatório técnico que antecedeu a decisão da escolha do lugar que receberia a capital, se projetava a utilização do Ribeirão Macacos, como solução, para a cidade mais populosa. Os ribeirões Mutuca e Fechos, articulados num mesmo processo de captação, são relatados, após a captação do Serra, Cercadinho, Barreiro, Rola Moça e Bálsamo, como as principais fontes para a solução dos problemas de abastecimento que batiam às portas da capital, desde, pelo menos, o final dos anos 30.

    b] O Município de Belo Horizonte não poupou esforços para desenvolver esse processo de captação e sucessivamente fez registrar, seja por Aarão Reis, como por Christiano Monteiro Machado, Octacílio Negrão de Lima, Juscelino Kubitschek de Oliveira e Celso Mello de Azevedo, uma preocupação constante com a proteção de mananciais e a ampliação da captação para o desenvolvimento futuro da cidade.

    E esse "resguardo futuro", medida sábia, precavida, nem por isso, em diferentes momentos, foi suficiente para evitar surpresas nas projeções de crescimento populacional e urbano e do papel econômico que a nova capital passaria a exercer, transcendendo em muito as finalidades político-administrativas para as quais fora criada. Como lembra, em 1964, o sociólogo Fernando Correia Dias, ao dispor dos "Aspectos Sociais da Falta d’Água em Belo Horizonte" ,

    "esse crescimento urbano em Belo Horizonte tem sido sintoma do progresso da cidade, da região e do Estado. É inegável, igualmente, que se processou de forma intensa e desordenada, ao influxo de fatores locais e regionais, mas também por motivações vinculadas a transformações no próprio sistema econômico brasileiro".

    Dele também citamos outras considerações:

    "A abundância e a boa qualidade de água servida às comunidades representam índices de progresso técnico e de civilização. Desejo encarar o problema do ângulo da coletividade. As utilidades decorrentes dos equipamentos fundamentais compõem o nível de vida da população e estão na fase do seu bem estar social.

    Na medida em que, num país como o Brasil, vai-se difundindo um padrão de cultura urbana moderna, as massas vão tomando consciência de que devem participar dos bens culturais e comerciais, digo materiais. O fenômeno da participação - na vida cívica e política, no consumo de tipo urbano, nas atividades culturais, etc. - é talvez o mais significativo de nossa época, do ponto de vista sócio-cultural. Não é necessário salientar a evidência de que a participação em bens da natureza, como a água, ainda que obtida e distribuída pelos mais refinados processos tecnológicos, é tranquilamente encarada por todos como direito elementar, como exigência irrecusável do bem-comum. Daí as atitudes coletivas de reação à falta desse bem indispensável, que é a água.

    [...]

    Não há nenhum outro problema de interesse geral que aguce tanto a sensibilidade popular, em todas as camadas: é tema constante de conversas; é assunto obrigatório da imprensa; é preocupação constante das autoridades; é ‘slogan’ político. Há outro aspecto relevante, que deve ser assinalado. Por mais irrisórias que fossem, as contas de água, por muito tempo, quando era menos complexo o orçamento municipal, representaram elemento considerável na arrecadação , notadamente na arrecadação constante de todo o ano, e não apenas das épocas fiscais favoráveis. Pois bem: as camadas populares, aquelas de menor capacidade contributiva, colaboravam, pelo pontual pagamento das taxas, com os cofres da Municipalidade. Tais setores da população estão convictos de que participavam e participam (apesar de, em muitos casos, não receberem o serviço) para a manutenção dos serviços sociais e financiamento das obras públicas".

    Outra expositora da citada Mesa Redonda foi Maria Ribeiro Pena, deputada e ex-Presidente da Associação das Donas de Casa de Belo Horizonte, que destacava a aplicação de "impostos, taxas e contribuições [...] em defesa do bem-estar coletivo", não se esquecendo de citar outras fontes, como empréstimos, isto é, endividamento público, para a solução prioritária da falta de água em nossa região.

    O papel da poupança coletiva, dos sacrifícios impostos à economia popular, para se consolidar este investimento no patrimônio público, neste bem comum, que é o acervo de mananciais e o sistema para a sua captação, não foi esquecido, portanto, por tantos que, sob diferentes pontos de vista, se debruçaram sobre o assunto.

    Concluí-se, pois, que a defesa e a implantação de uma política pública voltada a preservação dos mananciais destinados ao abastecimento público, não e minha e nem começou hoje mas, na realidade, é fruto de um trabalho exaustivos e compartilhado, pelas mais expressivas Autoridades Públicas e Políticas deste País, Estado e Município.

    Política pública esta, absolutamente concreta e de sucesso, eis que, mesmo que cruzassemos nossos braços neste momento, teríamos, como resultado deste trabalho divino desenvolvidos por homens de bem, no curso de mais de 113 (cento e treze) anos de investimentos públicos expressivos, disponibilidade hídrica por, pelo menos, mais 30 (trinta) anos.

    Sras. Deputadas e Srs. Deputados, esta política não pode ser mudada e, muito menos, à revelia dos legitimos representantes do povo de Minas, quiça do Brasil.

  5. Obrigado.