SÍNTESE DA PRIMEIRA REUNIÃO CONJUNTA DAS COMISSÕES DE MEIO AMBIENTE E RECURSOS NATURAIS E DIREITOS HUMANOS da 2ª Legislativa Ordinária da 15ª Legislatura
----------Dia
06 de agosto de 2004, houve uma Audiência Pública na Assembléia
Legislativa de Minas Gerais, promovida pelas Comissões de Meio Ambiente
e de Direitos Humanos, para que o Sr. Jean Pierre Leroy, Relator Nacional para
o Direito Humano ao Meio Ambiente, das Organizações das Nações
Unidas – ONU -, ouvisse depoimentos de cerca de 30 pessoas, representantes da
sociedade civil organizada, de diversas comunidades de Minas Gerais, que estão
sofrendo na péle as conseqüências dramáticas da monocultura
do Eucalipto, das minerações e das Barragens. A audiência
durou 5,5 horas. Em vários momentos o povo que participava chorou convulsivamente,
comovido e indignado com as denúncias que foram colocadas à luz
do sol. Abaixo, segue, uma síntese das 53 páginas taquigrafadas.
Sr. Presidente (Deputado Durval Ângelo):
----------A
finalidade desta Audiência Pública é ouvir o Sr. Jean-Pierre
Leroy, Relator Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente, das Organizações
das Nações Unidas – ONU -, que abordará as violações
ao Direito Humano ao Meio Ambiente, a partir de situações de injustiça
ambiental no Estado de Minas Gerais.
----------A
realização dessa Audiência foi a requerimento da presidência
da Comissão de Direitos Humanos, Deputada Maria José Haueisen,
do Presidente da Comissão de Direitos Humanos e dos Deputados: Padre
João e Rogério Correia.
----------Sempre
tentamos dar uma visão mais ampla dos direitos humanos e, dentro desses,
com toda a certeza, o direito ao meio ambiente equilibrado, como estabelece
a Constituição Federal. E, mesmo também, levantar a questão
dos direitos fundamentais e essenciais, como o direito à terra. Nessa
Comissão Conjunta, fizemos várias discussões sobre a questão
da violação da terra, sobre o Movimento dos Atingidos por Barragens,
constantemente provocados por grandes interesses econômicos em nome de
um pseudoprogresso.
Sr. Jean-Pierre Leroy:
----------O
Brasil assinou uma Convenção Internacional, um acordo, dizendo
que respeitaria os Direitos Humanos: o direito à vida, à liberdade,
à opinião, o direito político e civil. Mas com relação
ao direito à vida, de que ela adianta, se não tenho possibilidade
de dar alimentação à minha família, se não
tenho terra, saúde e educação?
----------Foi
um novo momento em que os países, notadamente na América, na OEA,
assinaram a Convenção dos Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais, que reconhece que todos deveriam ter acesso à alimentação,
à moradia, à educação e ao meio ambiente. Com a
parceria do governo, da ONU e da sociedade civil, foram elaborados relatórios
sobre alimentação, terra rural, água, moradia, educação,
saúde, trabalho, meio ambiente, etc. Sou Relator de Direitos Humanos
ao Meio Ambiente. É importante salientar que no relatório não
apresentarei apenas queixas. Apontaremos alternativas para as próprias
organizações e para as vítimas. A finalidade primeira não
é apresentá-lo a ONU, mas discuti-lo, aqui, no Brasil.
----------Direitos
Humanos ao meio ambiente é novidade. Estou vindo do Norte de Minas e
lá essa ligação, entre direitos humanos e meio ambiente,
é muito clara. A população que sobrevive do meio ambiente,
que está integrada a ele, tanto pela produção quanto pelo
extrativismo, criou uma relação consolidada e sustentável
com o meio ambiente. Elas têm uma participação extremamente
importante para o futuro, pois mantêm a biodiversidade e conservam as
águas e, após a minha visita, ficou claro que são produtoras
de água. Uma indústria de eucaliptos é consumidora de água.
O pequeno produtor, os geraizeiros, como são chamados, pela forma como
manejam os recursos, fazem com que a água brote, são produtores
de água. Portanto, o direito humano ao meio ambiente, o direito dessas
populações a continuarem produzindo, melhorando sempre é,
também, um direito que se estende a outras comunidades, outras regiões,
para o futuro. Elas estão defendendo não só seus direitos
mas, também, os direitos de outras regiões do Brasil e o direito
de gerações futuras na beira dos rios e nas capitais a terem água,
biodiversidade e um clima que possa garantir a sobrevivência ao conjunto
da população.
----------Estive
em Curvelo com minha equipe. Ficamos chocados com o que vimos: a comunidade
prensada pela monocultura, totalmente privada de água, portanto, impossibilitada
de produzir...
----------Estivemos
em Rio Pardo, na comunidade de Vereda Funda. Há 25 anos chegou lá
uma empresa falando de redenção, de plantação, dizendo
que tudo seria uma maravilha. Como a Chapada é coletiva, avançou
tanto em direção à vereda que estrangulou a comunidade
que mantinha perfeita integração entre a produção
e o extrativismo. A empresa – AGROMINAS -, já terminou seu ciclo de 23
anos. Agora, quer dizer que é dona porque obteve uma concessão
do Estado por 23 anos. E os que moram lá?
Novamente, temos uma forma de interpretação da legislação
e, sobretudo, o rolo compressor do ideário do desenvolvimento, que vai
dizer que uma empresa que produz menos empregos que o conjunto das famílias
do lugar tem precedência. Que tipo de desenvolvimento oferece e para quem?
----------Estivemos
em Cristália para encontrar um grupo de mais ou menos de 80 a 100 atingidos
de vários municípios pela Barragem de Irapé. Ficamos chocados
pelo modo como são tratados. Há 12 anos que está em curso,
que se prepara a barragem de Irapé e só há 2 anos que se
começou a pensar que tem gente! É uma inversão absoluta
de valores. É um tremendo erro político e também econômico.
Estou descrente com a situação. Poderia dar detalhes, há
gente passando fome, vivendo misérias, sendo esmagada, mas não
são coitados. O que vi foi gente com uma grande dignidade. Direito não
é se queixar, não é gemer, mas dizer que se considera um
cidadão e que a sua vida é uma luta por cidadania. Vi, também,
projetos de produção dando certo - colocaremos esses dados no
Relatório -, por exemplo, o que mostra a exploração de
pequi com a agroindústria e a comercialização, na realidade,
rende mais que o eucalipto. Faz todo sentido para a economia de Minas e para
a economia do país, manter o agroextrativismo, o pequeno produtor bem
inserido no ecossistema.
----------Agora
vamos convidar as pessoas dos lugares que visitamos para fazerem seus depoimentos:
O Sr. Denervaldo Fernando Lima:
----------Venho
da região do Norte de Minas, do Quilombo Gorotuba. O Quilombo tem aproximadamente
5000 pessoas. Estamos praticamente abandonados. Estamos impedidos de nos locomover
por falta de estradas. E temos outro problema, muito sério, que é
a questão da moradia. Essa região era do nosso povo, os negros
gorotubanos mas, hoje, 97% dessas terras estão nas mãos de fazendeiros
e, possivelmente, foram compradas das mãos de grileiros. Foram cercadas
e não produzem nada e não dão serviço pra ninguém.
Assim, o nosso povo ficou encurralado, não tem acesso às águas,
já que ficam dentro das grandes fazendas. Fazendeiros e políticos
estão aliados.
A Sra. Grace Borges dos Reis
– Sindicato dos Trabalhadores Rurais:
----------Estamos
cercados pela monocultura de eucalipto. Na minha comunidade há a presença
das companhias MANNESMANN, V&M e PLANTAR. Temos muitos problemas com plantios
irregulares, quase dentro dos córregos, quase dentro das nascentes. Não
estamos tendo água para mais nada. As comunidades locais estão
tendo que furar poços artesianos e pagar mensalidade para ter água
em casa. Nossa comunidade não tem como plantar. Além da falta
d`água, ainda, temos que conviver com o uso exagerado de agrotóxico.
Os peixes e os animais estão morrendo. A mega-empresa PLANTAR patrocina
quase todos os eventos da cidade: reforma APAEs, creches, escolas e igrejas.
Assim cala a boca do Poder Público e de grande parte do povo. Os pequenos
proprietários estão sendo forçados a vender suas terras
para as empresas do eucalipto e partem parar tentar sobreviver nas periferias
das cidades. Depois voltam, de ônibus, para trabalhar na mega-empresa
por um salário mínimo e uma cesta básica. De pequenos proprietários
está sendo reduzidos a bóias-frias.
O Sr. Elmy Pereira Soares:
----------O
que estamos vivendo, hoje, é muito difícil. Mas vou tentar dizer
como está a situação das pessoas que vivem no Norte de
Minas, na microregional do alto Rio Pardo,Vereda Funda e a situação
dos municípios atingidos pelo eucalipto. As famílias ficaram,
praticamente, nas grotas com o rio e os morros. Rio Pardo de Minas, hoje, tem
16 mil pessoas. Antes do plantio tinha 6 mil. Todos morando em barracos, sem
luz elétrica e sem água. Muitas crianças da zona rural
estão na prostituição. Ficamos preocupados, também,
porque algumas comunidades estão tendo conflito com os empreiteiros.
Depois de 25 anos a miséria é maior. Onde era plantado o arroz
não dá mais nada, nem mandioca. Secou tudo. Houve uma Ação
Civil Pública contra a empresa (?). O Promotor xingou o pessoal em vez
de ouvi-los. Há ameaça aos posseiros que pararam com a produção
de carvão à força, mas a firma(?) construiu outra carvoaria,
em outro local. Nossa situação é a seguinte: vamos enfrentar
a firma e defender nosso território ou teremos que sair de lá.
O BLOCO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS
O SR. Sebastião Pereira
de Souza:
----------Sou
de Botumirim e represento os municípios atingidos pela Barragem de Irapé.
Que todos saibam que nossos direitos são negados e desrespeitados quando
se constroem barragens nesse país. Tínhamos grande confiança
no Ministério Público Federal. Pedimos, então, que se cumpra,
de fato, o acordo que foi elaborado pelo Ministério Público e
pela CEMIG e descumprido pela Barrragem.
A Sra. Marta Caetana do Espírito
Santo:
----------Sou
da Barragem PHC Fumaça, construída pela ALCAN ALUMÍNIO
DO BRASIL .
----------Sofremos
grande pressão. Ora! Somos trabalhadores rurais, nascidos e criados num
cantinho que achávamos que era só nosso e sobrevivemos da terra,
de onde tiramos sustento para nós e para nossos filhos. De repente, chegou
uma empresa multinacional e mudou completamente a vida dos trabalhadores.
----------O
Movimento dos Atingidos por Barragem avisou aos trabalhadores que tinham direito
a terra... Houve impasse entre os trabalhadores e a empresa. Passaram a processar
os trabalhadores rurais. A ALCAN tinha que cumprir a condicionante de realizar
o reassentamento três meses antes do reservatório encher. A PHC
Fumaça está cheia a 1 ano e 4 meses e rola muito dinheiro em cima
disso. Peço à Comissão de Direitos Humanos que faça
um levantamento nas PHCs.
----------
Nosso governador AÉCIO NEVES mandou, dia três de maio, uma força
policial à Zona da Mata, em Candonga, e 192 policiais manobraram armas
na cabeça de crianças e idosos.
A Sra. Wanderli Alves dos Reis - Barragem do Pilar:
----------Barragem,
não! Águas para a vida, sim!
----------Somos
ameaçados pelo projeto Pilar que foi indeferido desde 1999. Se essa barragem
tivesse sido concluída, 120 famílias teriam suas terras inundadas
e talvez estivessem na mesma situação das famílias de Fumaça
ou talvez pior. Naquela época, não conhecíamos nossos direitos.
Conhecemos e não temos mais medo de correr atrás dos nossos direitos,
de vir aqui falar e denunciar. Temos muitos processos. Desde de 1995 temos esse
problema.
----------No
ano passado a ALCAN voltou à nossa comunidade querendo construir outro
projeto de barragem que atingiria mais ou menos 100 famílias. Ficamos
45 dias acampados na beira do rio para não deixar que a empresa fizesse
a sondagem e a análise da rocha, que é o primeiro estudo de viabilidade.
Infelizmente, os fazendeiros aceitam o projeto. O povo é que sofre, pois
é massacrado, alagado e entupido de água.
----------Vamos
perder o medo da empresa e nos unir...Se esperarmos pela nossa justiça
ficaremos sem terra, sem água, sem alimento, sem vida, sem nada.
Sr. Leonardo Pereira Rezende:
----------Sou
assessor jurídico da NACAB que é uma ONG e presto assessoria às
comunidades de atingidos por barragens. Os projetos de barragens, constantemente,
e cada vez mais, vêm causando violações aos direitos essenciais
da pessoa humana. Temos algumas preocupações específicas
sobre a construção de barragens hidrelétricas e sobre algumas
decisões de liberar a operação dos empreendimentos, sem
a resolução de todos os impactos sócio-ambientais. Essa
é a preocupação constante da NACAB que está cansada
de debater, administrativamente, e tem recorrido às ações
judiciais.
Movimento Capão
Xavier Vivo
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Tel: (31) 3221-3055
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