IV – DOS FATOS PERTINENTES A AÇÃO POPULAR

O fator determinante que norteou as decisões para escolha do local da cidade de Belo Horizonte, como nova Capital do Estado de Minas Gerais  foi: “1º. As condições naturais de salubridade (...); 2º abastecimento abundante de água potável, devendo ser examinados os mananciais que puderem ser aproveitados, não só quanto ao volume e qualidade das águas, mas  também quanto à altura disponível (...)”

Em relatório apresentado ao Presidente do Estado, Dr. Affonso Pena, pelo engenheiro civil Aarão Reis, em 1893, referente aos estudos das localidades indicadas para a nova capital, já se afirmava que “para recurso futuro(...) os ribeirões dos Macacos e da Pantana, qualquer deles mais importante que o do Arrudas (...) poderão ser canalizados para o serviço da nova cidade, quando esta atingir as proporções correspondentes à necessidade de tais trabalhos”.[1]

Diferente não foi, durante a gestão do prefeito Juscelino Kubitschek de Oliveira, a preocupação e o cuidado com os mananciais. O prefeito era ciente que desde a fundação da capital, o problema do abastecimento de água potável era motivo dos mais demorados estudos. Em meados de 1928 iniciou-se a canalização dos córregos “Rola Moça” e “Tabuões”, em Ibirité. O agravamento da carência no abastecimento levou à necessária utilização do “Mutuca”, quando foi então realizado estudo para a aquisição da bacia de forma a proteger-se de intromissão estranha. (grifos de nossa autoria)  

Fácil deduzir dois fatores significativos referentes ao abastecimento de água em Belo Horizonte.  

1o. – Os ribeirões Mutuca e Fechos, articulados num mesmo processo de captação, foram as principais fontes de abastecimento desde o relatório  técnico que antecedeu a escolha do lugar que receberia a capital. Ainda hoje são os mananciais de melhor qualidade que abastecem Belo Horizonte, seja pelo grau de pureza, que dispensa tratamento químico rigoroso, seja pela elevação natural, o que torna sua utilização  muito menos onerosa;

 

2o. – O município de Belo Horizonte não poupou esforços para desenvolver o processo de captação dos mananciais, processo que ficou evidenciado no esforço de administradores como os citados acima: Aarão Reis, Christiano Machado, Octacílio Negrão de Lima, Juscelino Kubitschek  e Celso Mello de Azevedo.  

Nota-se aqui, a preocupação ambiental da época com o reconhecimento da necessidade da preservação da bacia e sua aquisição para este fim e, chega a ser mesmo assustador, que o pensamento  dos homens públicos do ano de 1928 fôsse muito mais avançado do que as idéias que predominam entre os administradores públicos, no ano de 2004.  

O Prefeito Celso Mello de Azevedo teve a honra de concluir as obras em ano de grave seca em Belo Horizonte, e a conseqüente falta d´água.

Em nome do conceito de desenvolvimento sustentável e de aberturas legais inteligentemente deixadas pelos legisladores com o intuito de não engessar de forma definitiva necessidades imperiosas e regionais, os atuais responsáveis pelas concessões dos licenciamentos ambientais têm cometido atrocidades e aberrações quer levarão, sem duvida, em futuro próximo ao caos ambiental.

                        É significativa a posição tomada pela CUT na defesa do assunto em pauta quando afirma:  

..............................  

Na década de 80, os mananciais de Fechos, Mutuca, Barreiro e Catarina, todos situados na região metropolitana de Belo Horizonte, foram definidos como áreas “de interesse especial para proteção de mananciais”, de acordo como os Decretos Estaduais n.ºs 22.327/82, 21.372/81, 22.091/82 e 22.096/82 (DOC. 5.3).  

Na década de 90, nos termos dos artigos segundo do Decreto no 35.624/94, 37.812/96 e da Lei Estadual no. 13.960/2001 (que “Declara como área de proteção ambiental a região situada nos municípios de Barão de Cocais, Belo Horizonte, Brumadinho, Caeté, Catas Altas, Ibirité, Itabirito, Mário Campos, Nova Lima, Raposos, Rio Acima, Santa Bárbara e Sarzedo e dá outras providências): “TEM POR OBJETIVO PROTEGER E CONSERVAR OS SISTEMAS NATURAIS ESSENCIAIS À BIODIVERSIDADE, ESPECIALMENTE OS RECURSOS HÍDRICOS NECESSÁRIOS AO ABASTECIMENTO DA POPULAÇÃO DA REGIÃO METROPOLITANA DE BELO HORIZONTE E DAS ÁREAS ADJACENTES, COM VISTAS À MELHORIA DA QUALIDADE DE VIDA DA POPULAÇÃO LOCAL, À PROTEÇÃO DOS ECOSSISTEMAS E AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL” (DOC. 5.2), onde encontram-se situados os referidos mananciais.  

É claríssimo o esforço dos Legisladores em preservar os mananciais públicos, a fauna, a flora a qualidade de vida dos habitantes da Região Metropolitana de Belo Horizonte.  

Os órgãos estaduais, entretanto, debaixo do guarda-chuvas de “medidas mitigadoras e compensações” vêm ferindo frontalmente o próprio principio Constitucional e as Leis Estaduais que regem o assunto.

Como se pode pensar em mitigar a diminuição de vazão natural e a deteriorização da qualidade de águas de abastecimento público?

Como se pode imaginar a compensação quando se compromete o ambiente onde vivem os animais em extinção – como é o caso do lobo-guará?

Como se pode admitir prejuízo à saúde de populações vizinhas, seu desassossego, seu bem-estar, sem proposição decente que lhes devolvam, pelo menos em parte esses bens que sempre lhes pertenceram?

ÁGUA, FLORA, BEM-ESTAR SOCIAL, SAÚDE DA POPULAÇÃO, SOSSEGO, ANIMAIS EM EXTINÇÃO, CAVIDADES NATURAIS, FÓSSEIS VIVOS COMO OS MICROCRUSTÁCEOS NÃO SÃO NEGOCIÁVEIS. NÊSTES CASOS NENHUMA COMPENSAÇÃO É ADMISSÍVEL (Leme Machado, Direito Ambiental Brasileiro).

No entanto, a história não pára por aí. Os governos municipais e estaduais, ainda que contrários à legislação do próprio Estado de Minas Gerais (DOC 5.1) e aos princípios fundamentais presentes na Constituição da República de 1988, vêm celebrando convênios com o intuito de legitimar suas ações irregulares e/ou ilegais. Em junho de 1996, a MBR - Minerações Brasileiras Reunidas S/A, o IEF – Instituto Estadual de Florestas e a COPASA – Companhia de Saneamento de Minas e o Município de Belo Horizonte, em nome do “interesse público”, da “preservação da natureza” e da “proteção de mananciais e dos interesses privados da Mineradora”, pretendem sugerir a execução de seus projetos “dentro dos princípios do desenvolvimento sustentável”, visando conciliar os interesses da mineração e a proteção das bacias hidrográficas dos mananciais da Mutuca, Barreiro, Fechos e Catarina (DOC. 11).  

Como resultado desse convênio, coube ao IEF a implantação do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça e da Estação Ecológica dos Fechos. Para tanto, o Estado de Minas Gerais solicitou à MBR a cessão de 10 (dez) glebas de propriedades das mesmas, que totalizaram área de 888,20 ha para integrar as referidas unidades de conservação.  

Consta do referido acordo que o objeto do Convênio, constante da sua Cláusula Primeira, é a viabilização da implantação do Parque Estadual da Serra do Rola Moça, envolvendo os diversos mananciais situados nos municípios de Nova Lima, Ibirité, Brumadinho e Belo Horizonte.  

No entanto, é contraditório o objeto do Convênio uma vez que, ao mesmo tempo em que se viabiliza a criação de um Parque Estadual para proteger os mananciais, os partícipes declaram na “Cláusula Quarta” ter ciência dos direitos minerários da MBR relativos à jazida de Capão Xavier e declaram na “Cláusula Segunda” ter ciência de que a área integra aquela de proteção especial para fins de preservação de mananciais, conforme pode ser observado no texto abaixo:

 

“CLÁUSULA  SEGUNDA

...

2.1.3.1 – Os partícipes têm ciência de que a área descrita no item 2.1.3 acima, está inclusa nos limites estabelecidos pelo Decreto Estadual 21.372, de 1o de julho de 1981, que define a bacia hidrográfica como área de proteção especial para fins de preservação de mananciais.

...

CLÁSULA QUARTA

4.1Os partícipes têm ciência dos direitos minerários da MBR relativos à jazida de Capão Xavier (Grupamento Mineiro da Mutuca – 100/89) como o indicado na planta anexa, que rubricada pelos partícipes passa a integrar o presente instrumento para todos os efeitos de direito, na condição de ANEXO IV. O desenvolvimento desta lavra ocorrerá conforme o plano de lavra aprovado pelo DNPM – Departamento Nacional da Produção mineral, após obtido o respectivo licenciamento ambiental perante o Conselho Estadual de Política Ambiental – COPAM e obedecido o PLANO DIRETOR DO PROJETO CAPÂO XAVIER, referido na Cláusula Terceira, supra.”

...

 

Mas, não é só! Em manifesta inversão de valores e dos Princípios Básicos da Administração Pública, atentatório aos deveres de imparcialidade, legalidade e lealdade às Instituições por que se deve pautar os administradores públicos, na cláusula 6a, estabelecem que:  

 

CLÁUSULA  SEXTA

 

6.1 – O IEF, como membro integrante da Comissão Intergovernamental da APA SUL RMBH, assume o compromisso de, durante os trabalhos da referida comissão, buscar a adequação do zoneamento daquela área de proteção ambiental ao desenvolvimento das atividades minerárias nas jazidas de Capão Xavier e Tamanduá, de acordo com as mais modernas técnicas de proteção do meio ambiente. (destacamos)

 

                                                                        , o que,  foi denunciado ao Ministério Público Estadual – Promotoria de Justiça de Defesa do Cidadão (DOC. 11.1).  

Por outro lado, conforme pode ser observado no Termo de Compromisso firmado entre a COPASA e a MBR em 22 de julho de 1998 e na Avaliação dos Trabalhos Hidrogeológicos da Área de Capão Xavier, solicitado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, apontam, ambos, para riscos na exploração mineradora, propondo inclusive uma parceria para o monitoramento dos mananciais de forma a identificar os eventuais impactos e as providências a serem adotadas. (DOC 06 e 07)

Como se pode admitir que órgãos como COPASA, IEF, PREFEITURA DE BELO HORIZONTE, IGAM, celebrem convênios ou outorguem direitos todos com o objetivo de atender aos interesses da MBR?

Como se pode admitir danos diretos e indiretos a áreas de proteção integral como são a Estação Ecológica dos Fechos e o Parque Estadual do Rola-Moça?

O que dizer quando o IEF, assina convênio no sentido de “buscar a adequação do zoneamento daquela área ambiental ao desenvolvimento das atividades minerarias de Capão Xavier e Tamanduá, pasme o Eminente Julgador “...de acordo com a mais moderna técnica de proteção ao meio ambiente?...”

Pois tudo isso vem ocorrendo de forma sistemática, sorrateira, à revelia do conhecimento pleno da sociedade civil e de suas entidades representativas, comprometendo sem dúvida gerações futuras quanto aos bens essenciais á própria vida e ferindo de morte o art. 225 da nossa Carta Magna.

Todo este arcabouço buscando o amparo institucional, foi promovido e costurado pela MBR – Minerações Brasileiras Reunidas, com intuito único e exclusivo de obter as licenças para explotação de minério de ferro e manganês e premiar seus acionistas com lucro incalculável, em detrimento do empobrecimento da população, que certamente ficará com o ônus dos erros,  como nos lembra a CUT – Central Única dos Trabalhadores.

O fantasma da explotação mineral acompanha Belo Horizonte desde a sua fundação. Estamos situados numa das divisas do quadrilátero ferrifero. Águas de qualidade especial, estão consorciadas pela Natureza ao minério de ferro. Estamos no início de uma luta da população civil pelo seu direito á vida e ao Meio Ambiente equilibrado que certamente vão de encontro aos interesses da MBR – Minerações Brasileiras Reunidas e de sua acionista maior a COMPANHIA VALE DO RIO DOCE, de grande poderio econômico e que deveriam assumir, de fato, as responsabilidades ecológicas e sociais que tanto apregoam. Ambas são detentoras de direitos de lavra de grandes extensões próximas á nossa Capital.

Já é grande o passivo da MBR – Minerações Brasileiras Reunidas com a população metropolitana. O belo horizonte emoldurado pela Serra do Curral foi destruído em parte pela mineradora e suas antecessoras, apesar de seu tombamento. É só olhar para serra na sua cumeeira para atestarmos o crime que contra ela foi cometido. Mineraram parte de seu cume e o exportaram para o Japão.

A vítima atual é o Pico do Itabirito, Monumento Natural Nacional (tombado e destombado) com a conivência provavelmente dos olhos cegos da COPAM e do FEAM, mas que a JUSTIÇA, com olhos bem abertos poderá ver na fotografia (Doc) que acompanha esta inicial e que revela o estado do paciente. Na época do estrago causado a Serra do Curral, não havia ainda, a preocupação social com o meio ambiente e muito menos possuíamos uma legislação ambiental a ser obedecida. Ficou evidente aí o descaso da MBR – Minerações Brasileiras Reunidas, que não soube respeitar a população de Belo Horizonte  e cometeu o  crime ambiental que só cessou depois do dano feito, após mobilização popular. Mas e o estrago no Pico do Itabirito? Lamentavelmente, devemos imputá-lo ao COPAM, FEAM, IEF e IGAM, seus co-autores, na medida em que o autorizaram.  

EXATAMENTE O MESMO ESTRAGO ESTÁ SENDO INICIADO NA SERRA DO ROLA-MOÇA. JÁ PODEMOS VER PERFEITAMENTE DEMARCADO PELAS MAQUINAS O CORTE A SER FEITO NA CUMEEIRA DA IMPORTANTE SERRA, DENTRO DA ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL DE MUTUCA E DIVISA ADJACENTE COM O PARQUE ESTADUAL DO ROLA-MOÇA. APESAR DO CÓDIGO FLORESTAL (Lei nº 4771/65) E AINDA DA LEI ( 14309/2002) DO ESTADO DE MINAS GERAIS DETERMINAR QUE:

 

Art. 10º Considera-se área de preservação permanente aquela protegida nos termos desta lei, revestida ou não  com cobertura vegetal, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, de proteger o solo e de assegurar o  bem-estar das populações humanas e situadas:

IV – em nascentes, ainda que intermitente, qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 m (cinqüenta metros);

V – no topo de morros montes ou montanha,em área delimitada a partir da curva de nível correspondente a dois terços  da altura da elevação em relação a base;

VII – nas linhas de cumeada, em seu terço superior em relação à base, nos seus montes, morros ou montanhas, fração essa que pode ser alterada para maior, a critério técnico do órgão competente, quando as condições ambientais assim o exigirem;

Art. 12 – A utilização de áreas de preservação permanente fica condicionada a autorização ou anuência do órgão competente.

Par 1º Quando a área de preservação permanente integrar unidade de conservação, a autorização a que se refere o “caput” somente será concedida se assim dispuser seu plano de manejo, quando houver.

Art. 13  - A supressão de vegetação nativa em área de preservação permanente somente  poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizado e motivado em procedimento administrativo próprio, quando não existir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto.

Par. 3º Para fins do que dispõe este artigo, considera-se:

I – de utilidade pública:

a) a atividade de segurança nacional e proteção sanitária:

b) a obra essencial de infra-estrutura destinada a serviço público de transporte, saneamento ou energia:

c) obra, plano, atividade ou projeto assim definido na legislação federal ou estadual:

II – de interesse social:

Par. 6º - A supressão de vegetação nativa protetora de nascente somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.

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